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quinta-feira, 22 de maio de 2014

REMISSÃO ABDICATIVA, DECLARAÇÃO DE QUITAÇÃO - Acórdão do Tribunal da Relação do Porto - 18.02.2013



Acórdãos TRP

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
78/11.1TTSTS.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MACHADO DA SILVA
Descritores: REMISSÃO ABDICATIVA
DECLARAÇÃO DE QUITAÇÃO

Nº do Documento: RP2013021878/11.1TTSTS.P1
Data do Acordão: 02/18/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1

Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .

Sumário: I- A remissão abdicativa constitui uma das causas de extinção das obrigações, assumindo natureza contratual – art. 863.º, n.º 1, do CC.
II - A declaração da trabalhadora de que recebeu da sua empregadora “todos os créditos emergentes do contrato de trabalho e da cessação do mesmo, nada mais tendo a receber ou a reclamar, seja a que título for” é uma declaração genérica, a qual não pode ser havida como prova plena de que a declarante nenhum outro direito pretendia conservar, respeitante à relação jurídica laboral já extinta.
III - Mais se demonstrando que a empregadora não provou ter disponibilizado todos os créditos a que a trabalhadora tinha direito, aquela declaração, como quitação genérica, é insuficiente para concluir por um verdadeiro acordo negocial do interesse das partes.
Reclamações:

Decisão Texto Integral: Reg. nº 1745.
Proc. nº 78/11.1TTSTS.

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

1. B… intentou a presente ação, com processo comum, contra C…, pedindo o pagamento das seguintes quantias:
- € 1.504,16, a título de indemnização de antiguidade;
- € 1.068,66, a título de férias, subsídios de férias e de natal, proporcionais à duração do contrato;
- As retribuições que devesse normalmente auferir até trânsito em julgado da decisão final, designadamente a título de salários, férias, subsídios de férias e de natal;
- Juros de mora, à taxa legal, sobre os montantes supra referenciados e que se vencerem após a citação da Ré e até integral pagamento;
Para tanto, e em síntese, alegou que a ré a admitiu ao seu serviço em 01/07/2007, para exercer as funções de costureira, mediante a retribuição mensal ilíquida de € 475,00, tendo estado ao seu serviço até 20/09/2010, data em que a Ré procedeu ao seu despedimento por “inadaptação superveniente ao posto de trabalho”, sem que tivesse cumprido os legais procedimentos.
Assim, o despedimento é ilícito, nos termos da al. c) do art. 381º e 385º, ambos do Código do Trabalho, estando a ré obrigada a pagar-lhe a competente indemnização de acordo com a sua antiguidade, proporcionais de férias, subsídios de férias e natal, referentes ao ano de cessação do contrato de trabalho, bem como as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão.
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A ré contestou, alegando que, de facto, a cessação do contrato de trabalho por si promovida, por inadaptação superveniente da autora ao posto de trabalho, é verdadeira, ainda que não tenham sido cumpridas as comunicações escritas previstas no artigo 376º do Código do Trabalho.
Não tendo a autora atingido os objetivos previamente acordados, no dia 12 de julho de 2010 foi-lhe comunicada a intenção de se proceder ao seu despedimento, por inadaptação superveniente ao seu posto de trabalho, ao que a autora deu o seu assentimento. Assim, após a cessação do contrato de trabalho, ocorrida em 20/09/2010, ré e autora fizeram o competente acerto final de contas, emergente de tal cessação, tendo então a autora subscrito o recibo de quitação junto aos autos, no domicílio profissional da Ré, em 21/09/2010.
Tal declaração da autora consubstancia uma efetiva e manifesta declaração de quitação total e uma remissão abdicatória de todos os créditos, pelo que a ré nada lhe deve.
Caso assim não se entenda, alega, a título de proporcionais de férias, subsídios de férias e de Natal, referentes ao ano da cessação do contrato de trabalho, eram devidos pela ré o montante total ilíquido de € 1.026,78, e, pelos vinte dias de trabalho prestado no mês da cessação do contrato, eram devidos o montante ilíquido de € 358,66 [€ 316,66 de salário base e € 42,00 de subsídio de alimentação - 14 dias úteis]. Tais montantes, acrescidos à peticionada indemnização por antiguidade, perfazem o montante total ilíquido de € 2.889,60 [€ 1.026,78 + € 358,66 + € 1.504,16]. Ora, alega, a autora acordou com a ré em fixar o montante em dívida no valor total de € 3.000, a título de compensação pecuniária global pela cessação do contrato de trabalho, que lhe foi integralmente pago, mediante a entrega de um cheque no valor de € 1.149,65, e, em numerário, de € 1.850,35, no dia 21/09/2010, data em que a autora subscreveu o recibo de quitação total.
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A autora respondeu.
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Realizada a audiência de discussão e julgamento, com gravação da prova, foi, posteriormente, proferida sentença, julgando a ação parcialmente procedente, condenando a ré a pagar à autora a quantia global de € 10.052,43, acrescida de juros moratórios legais, desde a citação até integral pagamento, nos seguintes termos:
A) € 2.058,33, a título de indemnização de acordo com a sua antiguidade;
B) € 1.068,75, a título de férias, subsídio de férias e subsídio de natal, proporcionais à duração do contrato em 2010;
C) € 8.075,00, a título de retribuições que devesse normalmente auferir, até trânsito em julgado da decisão final, designadamente a título de salários, férias, subsídio de férias e de natal, que nesta data neste montante se contabiliza (de onde se devem descontar as importâncias que a trabalhadora auferiu, caso assim seja, a título de subsídio de desemprego);
D) Por força da quitação dada pela autora no que respeita ao valor de € 1.149,65, recebido quando da cessação do contrato, atingimos o valor global mencionado de € 10.052,43.
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Inconformada com esta decisão, dela recorreu a Ré, formulando as seguintes conclusões:
1) A recorrente discorda da douta sentença na íntegra, que a condenou a pagar à autora/recorrida a quantia global de € 10.052,43, acrescida dos juros moratórios legais, desde a citação até integral pagamento:
2) Foi decidido pelo tribunal a quo, na nossa opinião mal, que a autora apenas deu quitação de € 1.149,65, que por manifesto erro na apreciação da prova, foi julgado como o único valor pago aquando da cessação do contrato de trabalho;
3) Do douto despacho saneador resulta como matéria de facto assente que a ré exerce a atividade de confeção de vestuário em série, tendo admitido a autora em 01/07/2007, para exercer as funções de costureira, mediante a retribuição mensal ilíquida de € 475,00;
4) Ficou também assente que a ré comunicou à autora a intenção de proceder ao seu despedimento, por inadaptação superveniente ao seu posto de trabalho;
5) Após reclamação da ré à alínea E) da matéria assente constante do douto despacho saneador, que veio a ser devidamente corrigido, ficou ainda assente que tendo estado a trabalhar até 20/09/2010, a autora em 21/09/2010 subscreveu a declaração de fls. 36 dos autos, declarando e subscrevendo que "recebeu da sua ex-entidade patronal (...), todos os créditos emergentes do contrato de trabalho e da cessação do mesmo, nada mais tendo a receber ou a reclamar, seja a que título for";
6) Ora, tendo a alínea E) da especificação sido retificada nesse sentido, ou seja, que foi já na qualidade de ex-trabalhadora que esta declarou ter recebido todos os créditos, emergentes do contrato e da cessação do mesmo, e que nada mais tem a receber ou a reclamar, seja a que título for, independentemente da prova produzida em Audiência de Julgamento, foi a autora que naquela qualidade e desse modo, deu quitação total à sua ex-entidade patronal;
7) Aliás, essa é matéria de facto aceite pela autora, em sede de resposta à contestação, tecendo apenas considerações de direito, das quais discordamos inteiramente, pois que não impugnou aquela a veracidade e a genuinidade de tal documento de fls. 36, nem deduziu qualquer incidente de falsidade da sua assinatura;
8) Tal documento subscrito pela autora consubstancia uma efetiva, evidente e manifesta declaração de quitação total e uma remissão abdicatória de créditos a que tivesse direito, e que eventualmente não lhe tivessem sido pagos, o que não é o caso, como adiante se demonstrará;
9) A autora demonstrou ter conhecido bem o alcance dessa declaração, que livremente assinou, sem quaisquer reservas, ameaças ou coações, que também por si não foram alegadas e por ter recebido tudo a que tinha direito, não mais lhe sendo devido pela recorrente!;
10) Na nossa modesta opinião, ao ter conferido razão à ré, quanto à correção operada na alínea E) do douto despacho saneador, a consequência juridicamente correta, adequada e inevitável, deveria ter sido a imediata prolação de sentença absolutória daquela, por procedência das exceções perentórias invocadas na contestação, devidamente comprovadas – fls. 36 dos autos;
11) Ou seja, mesmo que a ré não tivesse produzido prova do pagamento integral de todos os créditos à autora, o que não foi o caso, estamos no âmbito dos direitos patrimoniais, livremente renunciáveis, porque a ex-trabalhadora já não se encontra sob a égide e subordinação da sua ex-entidade patronal, nem vinculada a esta;
12) É por isso incorreto juridicamente condenar a ré a pagar à autora o que quer que seja, porque era esta livre de renunciar aos seus direitos patrimoniais, mesmo que não tivesse recebido um único cêntimo!;
13) Condenar a ré é contrariar a declaração de fls. 36 subscrita pela própria autora, na qualidade de ex-trabalhadora, já depois de cessado o vínculo laboral subordinado, é violar a lei e o princípio da boa fé, é premiar o abuso de direito e o dito por não dito!
14) Tal documento é suficiente, sem demais prova, para a absolvição total dos pedidos, porém se Vossas Excelências assim não entenderem, à cautela, a recorrente passa a analisar os pontos da matéria de facto controvertida incorretamente julgados e a indicar os meios de prova que impunham decisão diversa da proferida;
15) O tribunal a quo deu como provado que a autora aceitou a cessação do contrato de trabalho, mas não deu como provado que ambas as partes acordaram em fixar o montante de todos os créditos devidos, no valor de € 3.000, e o depoimento da testemunha D... impunha decisão diversa;
16) O tribunal a quo deu como provado que o cheque de fls. 37 dos autos, no valor de € 1.149,65, datado de 20/09/2010, foi entregue à autora, mas não deu como provado que à mesma também foi entregue a quantia de € 1.850,35 em numerário, no dia 21/09/2010, data em que aquela assinou a declaração de quitação total, tendo por esses dois meios auferido os € 3.000, acordados a título de compensação global pela cessação do contrato de trabalho. Também neste ponto, o depoimento da testemunha D... impunha decisão diversa da adotada;
17) Como resulta da douta motivação das respostas à matéria de facto, o tribunal a quo considerou que as testemunhas da autora, amigas da mesma, de concreto pouco ou nada sabiam e que por sua vez, as testemunhas da ré também, com exceção de D..., que afirmou ter entregue à autora o cheque de fls. 37, no último dia de trabalho dela (20/09/2010), por conta da quantia acordada a pagar à mesma, no valor de 3.000 euros e que no dia seguinte (21/09/2010) lhe entregou o restante em numerário, após o que ela assinou a declaração de fls. 36:
18) Mais resulta dessa motivação que essa testemunha esclareceu que a autora acedeu cessar o contrato de trabalho e que ambas as partes acordaram no pagamento da quantia global de € 3.000, que lhe foi integralmente pago;
19) Não foram nem a declaração de fls. 36, nem o depoimento dessa testemunha da ré, nem as constantes contradições da autora suficientes para a prova dos factos controvertidos, alegados em sede de contestação e que impunham a absolvição total dos pedidos;
20) Terminada a produção de prova, determinou o tribunal a quo a audição da autora, em depoimento de parte, tendo aquela prestado um depoimento falso e contraditório, revelando-se como consta da douta motivação da resposta aos quesitos – "confusa";
21) Do grande emaranhado de afirmações e contradições da autora, o tribunal a quo só valorou que a mesma aceitou sair da ré e que quanto ao cheque e à declaração, tudo foi feito no mesmo momento, no dia seguinte ao seu último dia de trabalho;
22) Enquanto que o depoimento da testemunha D... foi prestado com lógica e coerência de raciocínio, revelando conhecimento direto, objetivo e isento, de quem interveio pessoal e diretamente por colaboração com a ré, na cessação do contrato de trabalho entre as partes e no pagamento de todos os créditos finais à autora;
23) A autora revelou durante todo o seu depoimento sucessivas e constantes incoerências, contradições e falhas de memória, inexplicáveis e injustificáveis, sobre uma matéria que lhe era pessoal e do seu interesse;
24) Tal depoimento quer pela forma como foi prestado, quer pelo facto de estar a autora comprometida com o êxito da ação, não podia merecer maior credibilidade ao tribunal que o da testemunha D...;
25) Para análise em detalhe por Vossas Excelências, de ambos os depoimentos e da acareação a ambos também oficiosamente determinada, a recorrente transcreveu excertos dos mesmos durante as alegações e transcreveu-os também na íntegra e em anexo que aqui se junta;
26) Durante a acareação, enquanto a testemunha D... reiterou todas as suas declarações, sem contradições, as declarações da autora continuaram a revelar-se confusas e sem ser minimamente convincente sobre a que pagamentos os cheques se referiram – página 3 do douto despacho de fixação da matéria de facto;
27) A única coincidência entre ambos os depoimentos é o facto dado por assente, de que ambas as partes acordaram pôr fim ao contrato;
28) Nos termos do disposto no art. 72° n° 4 do CPT, o tribunal a quo deu ainda como provado, por ser relevante para a boa decisão da causa, que a autora trabalhou até ao dia 15 de agosto de 2010, tendo gozado férias desde o dia seguinte até ao dia 07/09/2010, pelo menos, data em que lhe foi entregue o cheque de fls. 67 dos autos, no valor de € 1.090;
29) Cheque esse que a autora, maliciosamente e "escudando-se" em argumentos formais, quis que fosse desentranhado, por provar esse que as férias e respetivo subsídio através dele foi pago, ao contrário do por si alegado, em sede de resposta à contestação, que não foi esse, mas o cheque de fls. 37 dos autos que liquidou tais créditos;
30) Ficou assim demonstrada, mais do que a incoerência, a falsidade do depoimento da autora, devendo acrescentar-se que, já em sede de julgamento, e também em clara contradição com o seu segundo articulado, a autora ora afirmava que o cheque de fls. 37 pagava "coisas de atrasos", ora “o mês de junho e algumas horas atrasadas", ora "o subsídio de férias mais os dias de agosto", ora "o subsídio de férias e os dias de setembro", chegando ao ponto de se remeter ao silêncio, sem nada dizer, alegando que estava "um bocado nervosa"... - como é possível que este depoimento possa merecer alguma credibilidade?!;
31) O tribunal a quo não se convenceu da falsidade total deste depoimento, tendo-o valorizado, em detrimento do depoimento da identificada testemunha da ré, ao ponto de não considerar provado que aquela recebeu a quantia em numerário, que em conjunto com o cheque de fls. 37, ambos entregues por essa testemunha àquela, perfizeram o montante total de € 3.000,00 acordados entre as partes e pagos a título de compensação global pela cessação do contrato;
32) Tendo resultado assente que o contrato de trabalho cessou por acordo das partes, que à autora havia sido proporcionado o gozo de férias e que o subsídio de férias lhe havia sido pago, tendo a ré aceite indemnizar aquela em função da antiguidade da mesma (30 dias por cada ano e fração do último = € 1.504,16), pela remuneração dos 20 dias de trabalho prestado em setembro (€ 358,66) e pelos proporcionais de férias e subsídios de férias e de natal do ano da cessação do contrato (€ 1.026,78), perfazendo tais créditos o montante de € 2.889,60, arredondado por acordo para € 3.000,00 e efetivamente pago por meio de cheque de fls. 37 dos autos e o restante em numerário, como bem esclareceu a testemunha D..., nada mais tem a autora a receber;
33) É incompreensível o entendimento vertido na douta sentença de que a "aceitação da autora em pôr fim ao contrato tem de ser vista no quadro da relação laboral". Se assim fosse, teria que deixar de existir a revogação do contrato de trabalho, como uma das formas de o fazer cessar, pois que de outro modo, instalar-se-ia a insegurança e a incerteza perante as abundantes ações de anulação das revogações, a darem o "dito por não dito", tendo em vista o reconhecimento judicial do enriquecimento sem causa;
34) Por outro lado, a falta de cumprimento do documento escrito exigido nos artigos 349° e 350° do CT, não pode beneficiar a autora, que também a ela deu causa. No seu depoimento prestado em audiência de julgamento, a autora foi perentória em afirmar que aceitou a cessação do contrato, o único facto indubitável que resulta das suas declarações. Pelo que, conceder-lhe o direito a impugnar a cessação por vício de forma, quando todos os créditos, incluindo a indemnização, já lhe foram pagos na íntegra no dia seguinte ao terminus do contrato, tendo a autora, como ex-trabalhadora prestado quitação total a favor da ex-entidade patronal, é reconhecer o direito ao "dito por não dito" e ao abuso de direito, bem como ao enriquecimento sem causa, pois que a autora excedeu manifestamente os limites impostos pela boa fé;
35) Acresce que, mesmo que a cessação do contrato de trabalho se tivesse operado de forma ilícita, o que não é o caso, o valor da indemnização teria que ser calculado em função da antiguidade da autora, tendo sido dessa forma que ambas as partes acordaram, dado que a indemnização que foi englobada no montante de € 3.000, por ela auferidos;
36) Contrariamente ao decidido pelo tribunal a quo, a antiguidade da
autora foi de 3 anos, 2 meses e 20 dias e não de 4 anos e 4 meses!
37) Ficou demonstrado que com o pagamento à autora da quantia líquida de € 3.000,00, a título de compensação global pela cessação do contrato, a ré não se "furtou" ao pagamento de quaisquer quantias devidas, pois que aceitou pagar a mais do que o devido e a autora aceitou receber aquela quantia, tendo declarado nada mais ter a receber ou a reclamar;
38) Assim sendo, não faz o menor sentido a condenação da ré no pagamento "de todas as prestações pecuniárias que deixou de auferir desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da decisão", no valor de € 8.075,00!;
39) Os proporcionais de férias, subsídios de férias e de natal, relativos ao trabalho prestado no ano da cessação do contrato (263 dias) totalizam € 1.026,78 e não os sentenciados € 1.068,75, sendo certo que também tais créditos foram englobados no valor de € 3.000,00 pagos pela ré à autora, que deles deu quitação;
40) Decidiu mal o tribunal a quo ao não considerar provado que, para além do cheque junto a fls. 37, a autora recebeu € 1.850,35, de acordo com o depoimento isento, coerente e objetivo da testemunha D...;
41) Ao contrário do douto entendimento do tribunal a quo, a autora não deu quitação de € 1.149,65, mas antes, nos termos literais constantes de fls. 36 de “todos os créditos emergentes do contrato de trabalho e da cessação do mesmo, nada mais tendo a receber ou a reclamar, sela a que título for”;
42) Deve ser reconhecida judicialmente a autenticidade desse documento, uma vez que a autora reconheceu expressamente a veracidade do teor do mesmo, bem como da sua assinatura, devendo considerar-se produzida a prova plena da quitação total conferida por aquela, na qualidade de ex-trabalhadora;
43) Agiu a autora com má fé e com abuso de direito, com o intuito de receber o que já havia auferido, contrariando uma conduta anteriormente por si adotada e com o claro intuito de prejudicar a ré;
44) Em todos os negócios jurídicos, incluindo nos contratos de trabalho, devem presidir princípios de segurança e de confiança jurídicos;
45) Não tendo julgado procedentes as exceções perentórias invocadas na contestação, provadas por documento idóneo e com a consequente correção à alínea E) da matéria assente do douto despacho saneador, e não tendo a ré sido absolvida da totalidade dos pedidos, a douta sentença violou entre outras, as disposições legais previstas nos termos dos artigos 487° n° 2, 493° n° 3 e 496°, todos do CPC, bem como as previstas nos artigos 374° n° 1 e 376° n° 1, ambas do C.Civil;
46) A douta sentença violou ainda o disposto no artigo 334° do CC ao reconhecer ilegitimamente o direito exercido pela autora, em clara e manifesta contradição com a declaração por si subscrita, como aliás, a mesma reconhece, sendo o abuso de direito de conhecimento oficioso do tribunal;
47) O tribunal a quo premiou a autora, que agiu com má fé e com abuso de direito, desde a propositura da ação, alegando nos seus articulados não ter recebido o que já lhe havia sido pago, como ficou demonstrado com os cheques de fls. 37 e 67 dos autos, sendo manifestas as contradições ao longo do seu depoimento de parte e deste com os seus articulados e arguindo argumentos formais, ao solicitar o desentranhamento do cheque de fls. 67, contra a justiça e a boa decisão da causa!
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Contra-alegou a A., pedindo a confirmação do decidido.
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Nesta Relação, a Ex.ma Srª Procuradora Geral Adjunta emitiu o seu douto parecer no sentido do não provimento do recurso.
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Cumpre decidir.
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2. Factos provados (na 1ª instância):
A) A ré exerce a atividade de confeção de vestuário exterior em série.
B) No exercício dessa atividade admitiu a autora ao seu serviço em 01/07/2007.
C) Para exercer as funções de costureira, sob as ordens, direção e fiscalização da ré, mediante a retribuição mensal ilíquida de € 475,00.
D) A ré comunicou à autora a intenção de proceder ao seu despedimento, por inadaptação superveniente ao seu posto de trabalho.
E) Tendo estado a trabalhar para a ré até 20 de setembro de 2010, a autora, em 21/09/2010, subscreveu a declaração junta a fls. 36, cujo teor aqui se reproduz para todos os efeitos legais, aí declarando e subscrevendo, para além do mais, que “recebeu da sua ex-entidade patronal, a senhora D. C…, (…), todos os créditos emergentes do contrato de trabalho e da cessação do mesmo, nada mais tendo a receber ou a reclamar, seja a que título for.”
F) A autora recebeu da ré, pelo menos, a quantia de € 1.149,65, conforme cheque junto a fls. 37 dos autos.
G) A autora deu o seu assentimento ao aludido em D), razão pela qual aceitou pôr fim ao contrato que entre ambas existia.
H) A autora trabalhou até ao dia 15 de agosto de 2010, tendo gozado férias desde o dia 16 de agosto até, pelo menos, o dia 07/09/2010, data em que lhe foi entregue o cheque junto a fls. 67 dos autos (no valor de 1.090,00 euros).
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Fixação da matéria de facto:
Antes de mais, nos termos dos arts. 490º, nº 2, e 659º, nº 3, do CPC, por admitido por acordo – cf. arts. 6º, da PI, e 1º da contestação -, adita-se o seguinte factualismo, sob a alínea I):
«Em 20.09.2010, a Ré procedeu ao despedimento da Autora alegando o fundamento referido em D)».
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Nas suas alegações, e conclusões, a recorrente pretende a alteração da decisão da matéria de facto, considerando que foram incorretamente julgados pelo Tribunal a quo os pontos nº 2 e 3 da BI.
Para tanto, a recorrente fundamenta essa pretensão nos depoimentos indicados.
E, na verdade, a audiência de julgamento decorreu com gravação dos depoimentos prestados, estando estes, assim, acessíveis, nos termos e para os efeitos do art. 712º, nº 1, al. a), do CPC.
Inexistindo, assim, quaisquer obstáculos formais à modificação da decisão da matéria de facto, vejamos se a sua pretensão pode proceder no plano substantivo.
Recordemos apenas que esta Relação, ao reapreciar a prova, não pode ir ao ponto de tornar letra morta o princípio fundamental da livre apreciação das provas por parte do tribunal de 1ª instância (cf. art. 655º, nº 1, do CPC), a menos que este tribunal tenha incorrido em erro na apreciação do valor probatório dos concretos meios de prova.
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- art. 2º e 3º da BI.
O seu teor era o seguinte:
2º- «A Autora deu o seu assentimento ao aludido em D), razão pela qual acordou com a Ré pôr fim ao contrato que entre ambas existia, fixando o montante que lhe era devido, a título de compensação pecuniária global pela cessação do contrato de trabalho, no valor total de € 3.000,00?»;
3º- «Valor que lhe foi integralmente pago:
- Mediante a entrega do cheque aludido em F);
- E mediante a entrega pela Ré da quantia, em numerário, de € 1.850,35, no dia 21/09/2010, data em que a Autora subscreveu a declaração aludida em E)?»
As respostas dadas foram restritivas, correspondendo, respetivamente à alínea G) e à alínea F) dos factos supra transcritos.
Sustenta a recorrente que estes pontos deveriam ter sido considerados provados na totalidade, deles passando a constar, também, ter sido fixado em € 3.000,00 o valor total a título de compensação pecuniária global pela cessação do contrato de trabalho e ter sido feita entrega pela Ré da quantia, em numerário, de € 1.850,35, no dia 21.09.2010.
Para tanto, indica a recorrente o depoimento da testemunha D..., segundo o qual, no dia 21.09.2010, data da assinatura da declaração de fls. 36, foi entregue à recorrida a quantia de € 1.850,35 em numerário (para além do cheque de fls. 37), quantia acordada a título de compensação global pela cessação do contrato de trabalho.
Alega ainda a recorrente que este depoimento deve prevalecer sobre o depoimento prestado pela Autora.
Vejamos.
A testemunha D…, marido da ré, afirmou que foi ele quem entregou à autora o cheque de fls. 37, no valor de € 1.149,65, para pagar, segundo disse, a retribuição do mês de setembro e proporcionais do subsídio de natal, pagamento esse que fez no último dia de trabalho da autora.
Mais disse que aquele pagamento foi feito por conta da quantia acordada pagar à mesma, no valor de € 3.000, pelo que, no dia seguinte, entregou o restante, em numerário – não conseguindo precisar de que forma – após o que ela assinou a declaração de fls. 36, elaborada pela advogada da recorrente, Dr.ª E…. Mais disse que a autora se revelava inapta para o trabalho, pelo que a ré conversou com a mesma no sentido de pôr fim à relação laboral, tendo aquela acedido sair, acordando as partes o pagamento da quantia global de € 3.000, o que lhe foi integralmente pago, não explicando qual o motivo de o valor global de € 3.000 não ter ficado a constar da declaração de quitação.
Por seu lado, a A. B…, no seu depoimento, confirmando ter recebido o cheque de fls. 37, disse que, após a Ré lhe comunicar que a ia mandar embora, aceitou sair, desde que a mesma lhe “pagasse os seus direitos”, ainda que não soubesse muito bem concretizar os mesmos, mais afirmando que, no dia seguinte ao seu último dia de trabalho, em 21.09.2010, conforme combinado, da parte de tarde, deslocou-se ao escritório da advogada da ré, onde aquele cheque lhe foi entregue e onde assinou a aludida declaração, só depois sendo informada que o que recebera não correspondia àquilo a que de facto tinha direito.
Mais afirmou, de forma clara, que, não recebeu qualquer quantitativo em dinheiro naquela altura, afirmando que o cheque e a declaração foram ambas feitas no mesmo momento, ou seja, em 21.10.2010.
Na acareação efetuada, ambos mantiveram as suas versões.
Ora, da conjugação destes depoimentos, não esquecendo o relevo a dar ao art. 516º do CPC, entendemos que as respostas dadas, seguindo esta orientação, e traduzindo a livre e ponderada convicção da M.ma Juíza “a quo”, não merecem censura, assim improcedendo, nesta parte, as conclusões do recurso.
No entanto, e no tocante à citada alínea G), «A Autora deu o seu assentimento ao aludido em D), razão pela qual aceitou pôr fim ao contrato que entre ambas existia, a mesma não pode aceitar-se: desde logo, por a sua 1ª parte ser conclusiva, nos termos do art. 646º, nº 4, do CPC, enquanto a 2ª parte não só integra matéria não articulada, como sendo contraditória com o facto admitido por acordo e aditado supra, assim se eliminando tal alínea.
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3. Do mérito.
Nesta sede, as questões suscitadas são as seguintes:
- ilicitude do despedimento;
- remissão abdicativa;
- créditos emergentes da cessação do contrato de trabalho;
- abuso de direito e litigância de má fé.
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3.1. Ilicitude do despedimento.
Considerando que o despedimento ocorreu em 2010, é pacífica a aplicação ao caso do regime definido no Código do Trabalho, aprovado pela Lei nº 7/09, de 12.02 (que aprovou a revisão do Código do Trabalho), – de que serão doravante todos os artigos citandos sempre que outra origem não for mencionada –, atento o disposto no art. 7º, nº 1, da Lei nº 7/09.
Sustenta a recorrente que o contrato de trabalho celebrado com a Autora cessou por acordo das partes.
Não tem razão.
Desde logo, é pacífico que as partes nunca questionaram que a cessação do contrato ocorreu em 20.09.2010, data em que a autora foi despedida, por alegada inadaptação superveniente ao posto de trabalho.
O art. 373º define despedimento por inadaptação «a cessação do contrato de trabalho promovida pelo empregador e fundamentada em inadaptação superveniente do trabalhador ao posto de trabalho».
O art. 374º, nºs 1 e 2, prevê então duas situações de inadaptação: a primeira, aplica-se aos trabalhadores em geral, relativamente aos quais tenha ocorrido redução continuada de produtividade ou de qualidade, avarias repetidas nos meios afetos ao posto de trabalho ou riscos para a saúde do próprio, de outros trabalhadores ou de terceiros (nº 1); a segunda, aplica-se aos trabalhadores que exerçam cargos de complexidade técnica ou de direção, que não tenham cumprido os objetivos previamente fixados e formalmente aceites por escrito, tudo determinado pelo modo de exercício de funções (nº 2).
Num e noutro caso, além de a lei exigir a verificação cumulativa dos requisitos definidos no art. 375º, é ainda necessário que tais situações tornem praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho, sendo que as formalidades previstas para esta forma de cessação do contrato de trabalho estão elencadas nos artigos 376º a 378º, estando previstos no art. 379º os direitos do trabalhador despedido.
No caso em apreço, a cessação do contrato de trabalho promovida pela recorrente não observou os procedimentos e requisitos previstos nos citados normativos, pelo que o despedimento da autora se tem de considerar ilícito, nos termos do art. 385º.
Assim concluindo pela ilicitude do despedimento, importa agora apurar as consequências jurídicas de tais despedimentos.
E para o conhecimento desta questão importa apreciar a próxima questão: saber se se a declaração emitida pela Autora, a fls. 36, configura uma remissão abdicativa.
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3.2. Remissão abdicativa.
A questão que se coloca é a de saber declaração emitida pela recorrida em 21.09.2010 consubstancia remissão abdicativa dos créditos laborais a que tivesse direito. muito embora todos lhe tenham sido pagos.
Sustenta a recorrente que a declaração de fls. 36 foi produzida pela recorrida após a cessação do contrato de trabalho (pelo que os seus direitos patrimoniais eram já livremente renunciáveis). não tendo sido impugnada a genuinidade do documento ou arguida a falsidade da assinatura. pelo que consubstancia a mesma uma remissão abdicativa.
A sentença recorrida recusou tal remissão, para tanto, fundamentando do seguinte modo:
«Analisemos então o valor da dita declaração. Declara a autora na mesma que “recebeu da sua ex-entidade patronal, a senhora D. C…, (…), todos os créditos emergentes do contrato de trabalho e da cessação do mesmo, nada mais tendo a receber ou a reclamar, seja a que título for.”
O documento em apreço consubstancia, quanto a nós, mero recibo de quitação. A quitação, nos termos do art. 787º do CC, mais não é do que um documento em que o credor declara ter recebido a prestação que lhe é devida, constituindo uma simples declaração de ciência certificativa do facto de que a prestação foi cumprida pelo devedor e recebida pelo credor.
Analisando o documento aqui em causa, inquestionavelmente um documento particular assinado pela autora – a autoria da assinatura não foi impugnada –, intitulado «Declaração», o mesmo mais não é que mera quitação. Em tal documento a autora declara ter recebido, ainda que sem especificar quaisquer valores, todos os créditos emergentes do contrato de trabalho e da cessação do mesmo.
E mais declara "nada mais ter a receber”.
Ora, considerando que a declaração é emitida após a cessação do contrato de trabalho que vinculou as partes, poderá a mesma consubstanciar uma verdadeira declaração negocial abdicativa, pela qual a autora renuncia ou abdica dos créditos decorrentes do referido contrato, a que eventualmente ainda tivesse direito?
Face à manifesta controvérsia entre as partes sobre tal matéria, decisiva para a afirmação da remissão abdicativa, na ausência de prova segura sobre a mesma, entendemos que não.
Decorre do art. 863º do Código Civil, que se dá a remissão abdicativa, quando o credor, com a aquiescência do devedor, renuncia ao poder de exigir a prestação devida, afastando definitivamente da sua esfera jurídica os instrumentos de tutela do seu interesse que a lei lhe conferia (Cfr. Antunes Varela, Direito das Obrigações, 3.ª Edição, Volume II, pág. 208).
Será esse o caso dos autos?
De forma alguma.
Da leitura da aludida declaração, retiramos apenas uma afirmação genérica e abstrata, cuja leitura não permite concluir que a aqui autora está a abdicar dos créditos a que tem direito. Ao invés, quando declara que dá “recebeu todos os créditos …. E nada mais tem a receber ou reclamar”, está apenas a querer dizer que, na sua ótica, segundo os dados de que dispõe e o que crê, que recebeu tudo o que lhe foi pago ou está a ser pago. Esta “leitura” é ainda reforçada pela circunstância de, no caso dos autos, a autora ter sido despedida e ter recebido a quantia de € 1.149,65, conforme cheque junto a fls. 37 dos autos.
Nessa dita declaração, a autora não manifesta uma vontade de renunciar, abdicar de algum crédito. E, nada sendo dito naquele documento, que de forma séria e transparente afirmasse os valores efetivamente entregues e pagos, sabendo nós que a autora naquela data recebeu o cheque de 1.149,65 euros, teremos forçosamente que ver aquele documento 13 apenas como um recibo da entrega dessa mesma quantia (pois que naquele documento não consta quais os créditos laborais pagos, igualmente não consta ter sido paga qualquer compensação pela cessação do contrato de trabalho ou indemnização por antiguidade).
Sufragamos esta fundamentação, por traduzir uma correta aplicaçãp do direito aos factos provados.
Como é sabido, a remissão abdicativa constitui uma das causas de extinção das obrigações, assumindo natureza contratual, tal como decorre do art. 863.º, n.º 1, do CC: “o credor pode remitir a dívida por acordo com o devedor”.
Como contrato que é, a “remissão” exige o necessário consenso entre as partes e, daí, a emissão de, pelo menos, duas declarações negociais: uma delas a cargo do credor – declarando renunciar ao direito de exigir a prestação – e a outra por banda do devedor – declarando aceitar aquela renúncia.
Conforme escreve Antunes Varela (Das Obrigações em Geral, 2.° vol., pag. 232) “na remissão abdicativa é o próprio credor que, com a aquiescência do devedor, renuncia ao poder de exigir a prestação devida, afastando definitivamente da sua esfera jurídica os instrumentos de tutela do seu interesse que a lei lhe conferia”.
No presente caso, estamos perante uma declaração vaga e genérica, a qual não pode ser havida como prova plena de que a declarante nenhum outro direito pretendia conservar, respeitante à relação jurídica laboral já extinta.
Mostram os autos que tal declaração não integra um acordo vinculativo, assente sobre duas declarações contrapostas, mas perfeitamente harmonizáveis entre si, com vista a estabelecer a regulamentação da situação obrigacional das partes resultante da cessação da relação laboral existente entre ambas.
A recorrente/empregadora, como supra referido em sede de fixação da matéria de facto, não provou ter disponibilizado todos os créditos a que a trabalhadora/recorrida tinha direito, emitindo esta, assim, uma mera declaração de quitação genérica, insuficiente para concluir por um verdadeiro acordo negocial do interesse das partes
Improcedem, pois, as conclusões da recorrente.
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3.3. Créditos emergentes da cessação do contrato.
Sustenta a recorrente que:
- a antiguidade da autora devia ser a de 3 anos, 2 meses e 20 dias, e não de 4 anos e 4 meses, como foi considerado na sentença;
- não faz o menor sentido a condenação da ré no pagamento "de todas as prestações pecuniárias que deixou de auferir desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da decisão", no valor de € 8.075,00!;
- os proporcionais de férias, subsídios de férias e de natal, relativos ao trabalho prestado no ano da cessação do contrato (263 dias) totalizam € 1.026,78 e não os sentenciados € 1.068,75, sendo certo que também tais créditos foram englobados no valor de € 3.000,00 pagos pela ré à autora, que deles deu quitação;
Nesta parte, a sentença discorreu do seguinte modo:
«A ilicitude do despedimento acarreta para a entidade patronal que assim atua, a obrigação de pagar ao trabalhador despedido todas as prestações pecuniárias que deixar de auferir desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da decisão a proferir nos autos, bem como a obrigação de o readmitir no seu posto de trabalho, ou, se assim optar, de lhe pagar uma indemnização por antiguidade (artigos 389º nº 1, 390º e 391º do Código do Trabalho).
Deste modo, fixando-se a indemnização por antiguidade devida, o que se considera adequado e suficiente no caso concreto, em 30 dias de remuneração de base por cada ano de antiguidade, atingimos, no caso dos autos, a quantia de 2.058,33€ (475,00 x 4 anos e 4 meses).
Teria também a autora direito, na data de cessação do contrato de trabalho, a receber os proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de natal, relativos ao trabalho prestado em 2010 (ano da cessação do contrato de trabalho), que perfazem a quantia de 1.068,75€ (475,00 x 9: 12 x 3).
Pede também a autora, e a tanto tem direito, que lhe sejam pagas todas as prestações pecuniárias vencidas desde a data do despedimento até à data da sentença final (retribuições intercalares).
Com efeito, por força do disposto no art. 390º nº 1 do CT, o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do Tribunal que declare a ilicitude do mesmo, devendo ser descontadas as importâncias que o trabalhador auferiu com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento, tal como impõe na al. a-) do nº 2 do aludido normativo legal, bem como as retribuições auferidas pela trabalhador, a título de subsidio de desemprego, tal como impõe a sua al. c-), devendo, neste último caso, a empregadora entregar essa dita quantia à Segurança Social. Assim sendo, tendo a aqui autora visto cessar o seu contrato em 20/09/2010, dando entrada da presente ação em 07/02/2011, e estando nós em 19/04/2012, tem a mesma direito ao montante que, nesta data, se liquida em 8.075,00€, onde se incluem os respetivos subsídios de férias e de natal entretanto vencidos (475,00 x 17 meses)».
Concorda-se, no essencial, com esta fundamentação.
Efetivamente, a decisão merece algumas correções.
Assim, no tocante à indemnização de antiguidade, tendo em atenção a data de admissão da recorrida, 01.07.2007, a data da sentença, 19.04.2012, a antiguidade da recorrida era de 4 anos, 9 meses e 19 dias, pelo que a indemnização a ter em conta seria de € 2.285,00 [€ 475 x 5].
No entanto, como a autora, na petição, a esse título, apenas pediu o pagamento da indemnização de € 1.504,16 – cf. art. 9º da petição e conclusão do pedido, sob a alínea A) – não podia a sentença condenar em montante superior, nos termos do art. 661º, nº 1, do CPC.
No tocante aos proporcionais de férias, subsídios de férias e de Natal relativos ao trabalho prestado no ano de cessação, os mesmos são do montante de € 1.147,92 [(475 x 9 : 12 x 3 ) + (475 : 30 x 20 : 12 x 3)].
No entanto, como também aqui a autora, na petição, a esse título, apenas pediu o pagamento da quantia de € 1.068,66 – cf. art. 10º da petição e conclusão do pedido, sob a alínea B) – não pode a sentença condenar em montante superior, nos termos do art. 661º, nº 1, do CPC.
No tocante às retribuições vincendas, a recorrente não põe em causa o cálculo, apenas considera que não faz o menor sentido a sua condenação no pagamento "de todas as prestações pecuniárias que deixou de auferir desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da decisão", no valor de € 8.075,00, em função da declaração de fls. 36.
Como já supra referido, tal declaração não integra uma válida remissão abdicativa, pelo que improcede a pretensão da recorrente.
Concluindo:
Procedendo, em parte, as conclusões do recurso, a autora tem direito às seguintes quantias:
- € 1.504,16, a título de indemnização de acordo com a sua antiguidade;
- € 1.068,66, a título de férias, subsídio de férias e subsídio de natal, proporcionais à duração do contrato em 2010;
- € 8.075,00€, a título de retribuições vencidas até 19.04.12, sem prejuízo das vincendas, até trânsito em julgado da decisão final.
Considerando que a sentença, nessa parte, não impugnada, efetuou a dedução a essas quantias do montante de € 1.149,65, recebido pela autora, através do cheque de fls. 36, tem, assim, a autora direito à quantia de € 9.498,17.
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3.4. Abuso de direito e litigância de má fé.
Sustenta a recorrente que a autora agiu com má fé e com abuso de direito, desde a propositura da ação, alegando nos seus articulados não ter recebido o que já lhe havia sido pago, como ficou demonstrado com os cheques de fls. 37 e 67 dos autos.
Como é sabido, a violação, por qualquer das partes, do dever de cooperação previsto no art. 266º, nº 1, do CPC, pode traduzir uma litigância de má fé.
Na verdade, diz-se litigante de má fé – art. 456º/2 – quem, com dolo ou negligência grave:
a) tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c) tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.
Cabem, na definição legal, situações de má fé subjetiva, caracterizadas pelo conhecimento ou não ignorância da parte, e objetiva, resultantes da violação dos padrões de comportamento exigíveis.
Basta, pois, uma falta grave de diligência para justificar o juízo de má fé da parte.
Distinguem-se claramente, na formulação legal, a má fé substancial – que se verifica quando a atuação da parte se reconduz às práticas aludidas nas alíneas a) e b) do nº 2 do art. 456º, supra transcrito – e a má fé instrumental [als. c) e d) do apontado normativo].
Mas, em ambas, está presente uma intenção maliciosa, ou uma negligência de tal modo grave ou grosseira que justifica um elevado grau de reprovação ou de censura e idêntica reação punitiva.
Ora, no caso em apreço, a factualidade apurada não permite concluir que a A. tenha litigado com má fé, sendo que a atitude por ela assumida, na defesa dos seus interesses, expressa na petição, quer no sentido de existir despedimento ilícito quer no sentido da invalidade da declaração de fls. 36 como de quitação plena, não evidencia uma manifesta tentativa de alteração da verdade dos factos relevantes para a decisão da causa, bem pelo contrário veio a ser confirmada quer na 1ª instância quer nesta instância de recurso.
Assim sendo, improcede a pretensão da Ré de condenação da Autora como litigante de má fé.
Idêntica conclusão para o abuso de direito, uma vez que os factos provados demonstram que a autora se limitou a reclamar os seus direitos perante uma cessação ilícita promovida pela recorrente.
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4. Atento o exposto, e decidindo:
Acorda-se em conceder parcial provimento ao recurso da Ré, assim alterando a sentença recorrida nos termos supra referidos em 3.3, condenado a Ré a pagar à autora a quantia global de quantia de € 9.498,17, no demais se confirmando a sentença recorrida.
Custas por ambas as partes na proporção do seu decaimento, sem prejuízo do apoio judiciário concedido à autora.
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Porto, 18-02-13
José Carlos Dinis Machado da Silva
Maria Fernanda Pereira Soares
Manuel Joaquim Ferreira da Costa
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Sumário elaborado pelo relator:
I- A remissão abdicativa constitui uma das causas de extinção das obrigações, assumindo natureza contratual – art. 863.º, n.º 1, do CC.
II. A declaração da trabalhadora de que recebeu da sua empregadora “todos os créditos emergentes do contrato de trabalho e da cessação do mesmo, nada mais tendo a receber ou a reclamar, seja a que título for” é uma declaração genérica, a qual não pode ser havida como prova plena de que a declarante nenhum outro direito pretendia conservar, respeitante à relação jurídica laboral já extinta.
III- Mais se demonstrando que a empregadora não provou ter disponibilizado todos os créditos a que a trabalhadora tinha direito, aquela declaração, como quitação genérica, é insuficiente para concluir por um verdadeiro acordo negocial do interesse das partes.

José Carlos Dinis Machado da Silva

http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/60f2c3803911ed0480257b20005519ef?OpenDocument&Highlight=0,presta%C3%A7%C3%A3o,contas

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