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domingo, 12 de agosto de 2012

COMPARTICIPAÇÃO CRIMINOSA CO-AUTORIA - Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra - 27/06/2012


Acórdãos TRC
Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1588/10.3PBCBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ALBERTO MIRA
Descritores: COMPARTICIPAÇÃO CRIMINOSA
CO-AUTORIA

Data do Acordão: 27-06-2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE COIMBRA - VARA DE COMPETÊNCIA MISTA
Texto Integral: S

Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: REVOGADA PARCIALMENTE
Legislação Nacional: ART.º 26º, DO C. PENAL

Sumário: São elementos da comparticipação criminosa sob a forma de co-autoria:
- a intervenção directa na fase de execução do crime («execução conjunta do facto»);
- o acordo para a realização conjunta do facto; acordo que não pressupõe a participação de todos na elaboração do plano comum de execução do facto; que não tem de ser expresso, podendo manifestar-se através de qualquer comportamento concludente; e que não tem de ser prévio ao início da prestação do contributo do respectivo co-autor;
- o domínio funcional do facto, no sentido de o agente «deter e exercer o domínio positivo do facto típico» ou seja o domínio da sua função, do seu contributo, na realização do tipo, de tal forma que, numa perspectiva ex ante, a omissão desse contributo impediria a realização do facto típico na forma planeada.
No que respeita à execução propriamente dita, não é indispensável nem necessário que cada um dos agentes cometa integralmente o facto punível, que execute todos os factos correspondentes ao preceito incriminador, que intervenha em todos os actos a praticar para obtenção do resultado pretendido, bastando que a actuação de cada um, embora parcial, seja elemento componente do todo e indispensável à produção do resultado.

Decisão Texto Integral: I. Relatório:
1. Na 1.ª Secção da Vara de Competência Mista de Coimbra, após julgamento, em processo comum, com intervenção de tribunal colectivo, os arguidos:
- A..., solteiro, residente na Rua …., Coimbra; e
- B..., solteiro, actualmente preso no Estabelecimento Prisional de Coimbra;
foram condenados nos seguintes termos:
O primeiro arguido:
Pela prática em concurso efectivo e real, de:
- um crime de furto qualificado p. e p. pelos arts. 203.º, n.º l e 204.º, n.º l, al. b) do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão;
- um crime de abuso de cartão de crédito, na forma continuada, p. e p. pelos artigos 225.º, n.º 1 e 30º n.º 2 do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de prisão;
Em co-autoria e em concurso real e efectivo com os anteriores, de:
- um crime de falsificação de documento autêntico, p. e p. pelo art. 256.º, n.º l, als. c) e d) e n.º 3 e 26.º, do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de prisão;
- um crime de burla, p. e p. pelos arts. 217.º, n.º 1 e 26.º do Código Penal, na pena de 10 (dez) meses de prisão.
- Na pena única de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, cuja execução foi declarada suspensa na sua execução por igual período, sujeita a regime de prova, a incidir na vertente do tratamento e acompanhamento da situação de toxicodependência do arguido, sua integração social e profissional.
O segundo arguido, como co-autor e em concurso real e efectivo de:
- um crime de falsificação de documento autêntico, p. e p. pelo art. 256.º, n.ºs l, als. c) e d) e n.º e e 26.º, do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de prisão;
- um crime de burla, p. e p. pelos arts. 217.º, n.º 1 e 26.º do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão.
- na pena conjunta de 1 (um) ano e 11 (onze) meses de prisão.
Foram ainda os arguidos condenados nos seguintes termos:
- solidariamente, a efectuarem o pagamento ao demandante C... da quantia global de 200,00€ (duzentos euros), a título de danos patrimoniais;
- o arguido A... a efectuar ainda o pagamento ao referido demandante da quantia de 150,00€ (cento e cinquenta euros), para ressarcimento de danos patrimoniais.
As tais quantias acrescem juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data da notificação do pedido cível e até integral pagamento.
*
2. Inconformado, o arguido/demandado B... interpôs recurso do acórdão, tendo concluído a respectiva motivação com as seguintes (transcritas) conclusões:
1.ª - O recorrente considera incorrectamente julgados os factos dados como provados nos pontos 9 a 17 da fundamentação de facto.
2.ª - Os factos dados como provados nos pontos 9 a 17 deveriam ter sido dados como não provados atendendo às declarações do próprio Arguido/recorrente, ao depoimento da testemunha ..., e, ainda, por total de ausência de prova testemunhal, documental, pericial ou outra que permitam ao Tribunal ao quo ter dado como provados tais factos.
3.ª - O Tribunal a quo condenou o ora Recorrente pela prática do crime de falsificação de documento autêntico previsto e punido pelo art. 256.º, n.º l, alíneas c) e d) e n.º 3 e 26.º do CP - sem qualquer prova de facto, concreta e objectiva para o fazer.
4.ª - O Tribunal a quo, apesar de ter considerado o depoimento da testemunha ... como um depoimento esclarecedor, objectivo, contundente e merecedor de credibilidade, desprezou-o por completo na parte em que garante ao Tribunal que a letra e assinatura que se encontra no cheque em causa nos presentes autos não é do seu filho - ora Recorrente.
5.ª - Pelo que, deveria constar dos factos dados como não provados os factos descritos nos pontos 9 a 17 da fundamentação de facto, e, em consequência, ser o ora Recorrente absolvido da prática do crime de falsificação de documento autêntico.
6.ª - Não o tendo feito, o Tribunal a quo violou o princípio fundamental do direito processual penal, e até, reconhecida pela Lei Fundamental - o principio in dubio pro reo - art. 32.º da CRP.
7.ª - Por outro lado, o Tribunal a quo, ao ter condenado o ora Recorrente pela prática de um crime de falsificação de documento autêntico sem qualquer prova de facto que suporte tal condenação violou claramente o art. 127.º do CPP.
8.ª - O principio da “livre apreciação da prova” previsto naquele artigo não significa livre arbítrio ou valoração puramente subjectiva, mas a apreciação que se realiza de acordo com critérios lógicos e objectivos e, dessa forma, determina uma convicção racional, logo, também ela, objectivável e motivável.
9.ª - No caso em concreto, existe um concurso meramente aparente entre a prática do crime de falsificação de documento e do crime de burla.
10.ª - Dos factos que resultam provados pelo Tribunal recorrido resulta, sem qualquer dúvida, que o preenchimento do cheque em causa e a falsificação da assinatura do Sr. Brandão foi só um meio para atingir um determinado fim - receber a quantia aposta no cheque!
11.ª - Embora os bens jurídicos protegidos sejam diferentes, no do preenchimento e da falsificação da assinatura aposta no referido cheque e da burla, a verdade é que existem pontos de contacto ou até sobreposições entre estes.
12.ª - Existem muitos exemplos, para além do caso dos presentes autos, em que os bens jurídicos protegidos são diferentes, e nem por isso existe um concurso real ou efectivo entre as várias infracções.
13.ª - O problema reside, antes, em saber se uma determinada conduta, criminalmente relevante (no caso a falsificação), está ou não contida em outro comportamento típico mais abrangente (a burla).
14.ª - Ora, no caso em concreto, e salvo melhor entendimento, entendemos que sim, pois a falsificação foi só um meio para atingir um determinado fim!
15.ª - O que houve foi a tentativa de uma única resolução criminosa, o que determina uma equivalente unicidade ao nível do crime cometido.
16.ª - No caso concreto, punir as duas condutas - a de falsificação e a de burla - corresponde à punição dupla do Arguido pelo mesmo facto,
17.ª - O que consubstancia a violação do princípio básico do nosso direito penal, consagrado na nossa Lei Fundamental no art. 29.º, n.º 5 da C.R.P.
18.ª - Pelo exposto, não deveria o ora Recorrente ser condenado pela prática do crime de falsificação de documento autêntico, mas apenas pala prática do crime de burla, sob pena de se estar a violar o artigo 29.º, n.º 5 da CRP!
19.ª - As medidas concretas das penas, quer as parcelares, quer a pena única são manifestamente exageradas, tendo em conta que, nos presentes autos, está em causa um valor diminuto (50,00 €), tendo em conta que o ora Recorrente, à data dos factos era toxicodependente, e atendendo ainda a que o Recorrente se encontra em reclusão e tem um percurso prisional exemplar que demonstra bem a sua vontade e capacidade para se ressocializar e seguir o seu caminho longe da prática de crimes, tudo em violação do disposto no art. 70.º, 71.º e 77.º do CP.
Normas violadas:
1. Arts. 70.º, 71.º e 77.º do CP;
2. Art. 32.º da CRP;
3. Art. 29.º, n.º 5 da CRP;
4. Arts. 256.º, n.ºs 1, alíneas c) e d), e 3 e 26.º do CP; e
5. Art. 127.º do CPP.
Termos em que e nos mais do douto suprimento de V. Exas. deve ser dado provimento ao presente recurso revogando-se a douto Acórdão recorrido, substituindo-o por um outro que:
a) Declare como não provado os factos descritos nos pontos 9 a 17 da fundamentação de facto, e, em consequência, o ora Recorrente ser absolvido da prática do crime de falsificação de documento autêntico.
Caso assim não se entenda:
b) Declare que, nos presentes autos existe um concurso meramente aparente entre a prática do crime de falsificação de documento e a prática do um crime de burla e, em consequência, o ora Recorrente ser absolvido da prática do crime de falsificação de documento autêntico.
Caso V. Exas. assim não entendam, ainda, devem:
c) As medidas concretas das penas, quer as penas parcelares, quer a pena única aplicada em cúmulo jurídico ser declaradas manifestamente exageradas, devendo as mesmas ser reduzidas ao seu mínimo legal, ou muito perto dele.
Com o que se fará a tão acostumada justiça!
*
3. O Magistrado do Ministério Público junto do tribunal de 1.ª instância, na resposta que apresentou ao recurso, manifestou-se no sentido da sua improcedência.
*
4. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, em parecer a fls. 675/677, pugna pela procedência parcial do recurso, preconizando a manutenção do decidido no acórdão recorrido, com excepção da pena parcelar relativa ao crime de falsificação de documento, que deverá ser fixada entre 1 ano e 1 ano e 2 meses de prisão, e, consequentemente, da pena única, a situar em 1 ano e 8 meses de prisão.
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5. Notificado, nos termos e para os efeitos consignados no art. 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, o recorrente não exerceu o seu direito de resposta.
*
6. Colhidos os vistos legais, foi o processo submetido a conferência, cumprindo agora apreciar e decidir.
*
II. Fundamentação:
1. Poderes de cognição do tribunal ad quem e delimitação do objecto do recurso:
Conforme Jurisprudência constante e pacífica, são as conclusões extraídas pelos recorrentes das respectivas motivações que delimitam o âmbito dos recursos, sem prejuízo das questões cujo conhecimento é oficioso, indicadas no art. 410.º, n.º 2 do Código de Processo Penal (cfr. Ac. do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19 de Outubro, publicado no DR, 1-A de 28-12-1995).
Assim, no caso sub judice, o objecto do recurso está circunscrito às seguintes questões:
A) Alterabilidade da matéria de facto, nos pontos concretamente impugnados pelo recorrente;
B) Se o tribunal, ao dar como provados os pontos de facto 9 a 17, determinantes da condenação do arguido B.... pela prática do crime de falsificação de documento autêntico, violou o princípio in dubio pro reo;
C) Se o tribunal a quo, ao ter condenado o arguido B.... pela prática daquele ilícito penal sem qualquer prova de facto que suporte tal condenação, violou o artigo 127.º do Código de Processo Penal;
D) Se alterada a matéria de facto em consonância com os desígnios do recorrente, este deve ser absolvido do crime de falsificação de documento que lhe está imputado e pela prática do qual foi condenado no tribunal a quo;
E) Caso assim não seja entendido, se entre os crimes de falsificação de documento e de burla existe concurso aparente, devendo o arguido ser condenado, de todo o modo, tão só pelo crime de burla;
F) Se, no caso concreto, a condenação do arguido pelos imputados crimes de falsificação de documento e de burla corresponde a uma dupla punição pelo mesmo facto, traduzindo a violação do princípio básico consagrado no artigo 29.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa;
F) Medida das penas (parcelares e única).
*
2. No acórdão recorrido, foram dados como provados os seguintes factos:
1. Em 8 de Setembro de 2010, da parte da manhã, o arguido A... decidiu abrir a viatura de marca Peugeot, pertencente a C..., que se encontrava estacionada na Rua … , junto à Estação de Comboios de Coimbra B, nesta cidade de Coimbra, a fim de fazer seu o material de valor que ali encontrasse.
2. Em execução de tal propósito, aproximou-se da aludida viatura que abriu, por forma não apurada, e onde entrou de seguida.
3. No interior da viatura deparou-se com um auto-rádio, no valor de pelo menos 150,00€ e uma carteira porta-documentos que continha no interior a carta de condução, cartão de contribuinte, cartão de utente do Serviço Nacional de Saúde, tudo em nome de C... e, ainda, um cartão visa e outro multibanco da Caixa Geral de Depósitos, um cartão de crédito WW... com o n.º … , e vários impressos de cheque, em branco, da conta n.º … , da Caixa Geral de Depósitos, também àquele pertencentes, que o arguido A...guardou e, levando-os consigo, saiu da viatura e afastou-se do local.
4. O arguido A... agiu de forma livre, voluntária e consciente, com o propósito de fazer seu o auto-rádio, carteira, cartões, documentos e impressos de cheques que se encontravam no interior da viatura de matrícula 87-58-CR, pertencentes a C....
5. Bem sabia o arguido que tais bens não lhe pertenciam e que actuava contra a vontade do respectivo dono.
6. Estava também consciente que praticava acto proibido e criminalmente punido.
7. Ainda da parte da manhã (desse dia 8 de Setembro de 2010), o arguido A...encontrou o arguido B..., que conhecia também por consumir produtos estupefacientes.
8. Abordou, então, o arguido B... no sentido de este o ajudar a levantar os impressos de cheque da conta n.º 11656200, acima referido.
9. O arguido B.... sabendo que o arguido A... não era o legitimo titular da conta e dos impressos de cheque, bem sabendo que o arguido A...era consumidor de estupefacientes, logo aceitou diligenciar pela sua apresentação a pagamento, na condição de uma parte lhe ser entregue.
10. Então, os arguidos A...e B...diligenciaram entre si pelo preenchimento do cheque n.º 2295408777, nele fazendo apôr uma assinatura como sendo a de C... e o montante de €50,00, a data de 7 de Setembro de 2010, deixando em branco o espaço respeitante ao tomador.
11. Combinaram, então, que o arguido B.... ia contactar a sua mãe e convencê-la a, por eles, proceder ao levantamento do cheque n.º 2295408777.
12. Assim, seguindo o acordado com o arguido A… , pouco antes das 12 horas, desse mesmo dia 8 de Setembro de 2010, o arguido B...dirigiu-se para a Rua … , onde habitava sua mãe, ..., e dizendo-lhe que o cheque n.º … lhe fora entregue pelo patrão e que não o podia levantar por não ter o bilhete de identidade, pediu-lhe que se deslocasse consigo à Caixa Geral de Depósitos, para proceder ao seu levantamento.
13. Convicta de que o que o filho dizia correspondia à verdade, ..., munida do cheque n.º … , deslocou-se, pelas 12h 11m, à agência da CGD da Loja do Cidadão, nesta cidade, e, como se fosse sua legítima portadora, apresentou para desconto o aludido cheque, que o funcionário que a atendeu, desconhecendo a forma ilegítima como fora obtido e bem assim a forma como fora aposta a assinatura do mesmo como sendo a de C..., logo pagou, entregando a ... a quantia de € 50,00 retirada da conta n.º … , pertencente a C....
14. Efectuado o levantamento, ... de imediato entregou os € 50,00 ao arguido B.... que posteriormente dividiu tal montante com o arguido A… .
15. A... e B... agiram de forma livre, consciente e voluntária, em conjugação de esforços e intenções, com o propósito de obterem benefícios injustificados.
16. Ao diligenciaram pelo preenchimento do impresso de cheque n.º … , e pela aposição no mesmo de uma assinatura como sendo a de C... e ao apresentá-lo na instituição bancária sabiam estar a violar a segurança daquele meio de pagamento e a fé pública depositada em tais títulos de crédito e que mediante tal estratagema logravam induzir em erro os funcionários bancários.
17. Sabiam, ainda, os arguidos A...e B...que, desse modo, causavam prejuízo a C..., titular da conta n.º … e que aquelas condutas eram proibidas por lei e criminalmente punidas.
18. Nesse mesmo dia 8 de Setembro de 2010, o arguido A...decidiu fazer uso do cartão de crédito WW... com o n.º … , subtraído do interior da viatura de matrícula … , para aquisição de telemóveis e outros artigos electrónicos.
19. Pouco antes das 12h 57m dirigiu-se à Loja WW.../Continente no Centro Comercial Forum Coimbra e escolheu um telemóvel associado à Vodafone, no valor de € 109,00.
20. Entregou, então, para pagamento do telemóvel o cartão n.º … pertencente a C..., dando ordem para debitar a quantia de € 109,00, e digitando, de seguida, o código respectivo.
21. Pelas 16 horas, o arguido A...voltou à Loja WW.../Continente, no Centro Comercial Forum Coimbra, para adquirir novos artigos.
22. Escolheu, então, uma TV LCD da Marca Samsung, no valor de € 399,00, um PC Toshiba, no valor de € 449,00 e um telemóvel associado à Vodafone, no valor de € 109,90.
23. Dirigiu-se, de seguida, à caixa e, mais uma vez entregou, para pagamento, o cartão de crédito n.º … , pertencente a C..., dando ordem para debitar o montante global de € 957,90 e, digitando, de seguida o código respectivo.
24. Cerca das 20 horas, o arguido A...voltou à Loja da WW.../Continente já indicada para adquirir mais artigos.
25. Escolheu, então, um telemóvel associado à Vodafone, no valor de € 119,90.
26. Dirigiu-se à caixa e, novamente entregou, para pagamento, o cartão de crédito n.º … , pertencente a C..., dando ordem para debitar no mesmo o montante de € 119,90, e digitando, de seguida, o código respectivo.
27. Em tudo se fez o arguido passar pelo legítimo titular do cartão mencionado, ocultando aos funcionários da WW... que o atenderam a forma ilícita como havia adquirido o cartão, os quais, convencidos de que o arguido A...era o seu verdadeiro titular, aceitaram usar tal cartão para pagamento dos artigos por ele escolhidos, assim levando a WW... e a Cetelem, entidade financiadora do cartão, a pagar os montantes relativos às transacções comerciais referidas, num valor global de € 1187,70, montante que depois, debitaram na conta de C..., para por este ser pago na totalidade ou fraccionadamente.
28. A... actuou de forma livre, voluntária e consciente, utilizando o cartão de crédito n.º … , sem que para tal estivesse autorizado e contra a vontade de C..., seu titular e da entidade emitente e financiadora, dessa forma pretendendo, e conseguindo, que esta última assegurasse o pagamento das despesas que foi efectuando na Loja WW... do Centro Comercial Forum Coimbra, sendo que ao entregá-lo por três vezes actuou também o arguido movido pelo êxito que sucessivamente foi obtendo, vendo a sua conduta facilitada pelo facto de continuar a dispor do referido cartão.
29. Bem sabia o arguido que, com tais condutas, causava, como efectivamente causou, prejuízo a C....
30. Igualmente sabia que aquelas condutas lhes estavam vedadas por lei e eram criminalmente punidas.
31. Em consequência da conduta dos arguidos, o demandante C... ficou sem a quantia de 50,00€ relativa ao levantamento do cheque.
32. Mercê da conduta levada a cabo por ambos os arguidos, o requerente foi obrigado a proceder ao cancelamento dos cartões de crédito, dos cheques, obter novo cartão de cidadão e adquirir novos cartões.
33. Bem como teve que se deslocar à PSP, primeiro para fazer a denúncia, e depois desde a sua residência sita em Semide, concelho de Miranda do Corvo, a fim de ser ouvido em sede de inquérito, o que fez em carro próprio, tendo percorrido cerca de 20km, bem como ao escritório do seu advogado, gastando com as mesmas quantia não concretamente apurada;
34. Tendo em consequência de tais factos e deslocações ficado privado de ir trabalhar, pelo menos durante o período de dois dias, deixando de auferir uma quantia de cerca de 100,00€.
35. Os arguidos à data dos factos eram consumidores de produtos estupefacientes e destinavam o produto obtido com a prática dos factos ao seu consumo.
36. B... está preso desde 13-10-2010 e cumpre à ordem do processo 260/07.PCCBR, T Secção Vara de Competência Mista e Juízos Criminais de Coimbra, uma pena de 6 anos de prisão.
37. B... é o único filho de um casal bem inserido socialmente e com uma boa situação económica. Frequentou o ensino até aos 18 anos de idade, sofreu reprovações e apenas concluiu o 10.º ano de escolaridade.
38. Quando foi preso desencadeou síndroma de abstinência face às drogas, esteve integrado em programa de metadona e desde Agosto que deixou por se apresentar estável e sem consumos.
39. No decurso da execução da pena tem vindo a manter comportamento consentâneo com as normas internas, está inscrito na escola, tencionando aproveitar o período de reclusão para melhorar as suas competências, designadamente, aumentar o nível de escolaridade. Na entrevista revelou alguma consciência crítica face ao seu percurso de vida, contudo, desculpabiliza-se com a sua problemática de toxicodependência, parecendo minimizar os danos que causou às vítimas.
40. Tem beneficiado de apoio familiar no decurso da reclusão, designadamente da mãe que o visita, mas não poderá contar com idêntico apoio no exterior, já que esta se mostra indisponível para o acolher em sua casa.
41. Socialmente o arguido tem uma imagem algo negativa, associada aos seus anteriores comportamentos toxicodependentes.
42. O arguido B.... sofreu as seguintes condenações:
- PCC 282/08.0GCTND, pela prática de um crime de roubo, por decisão de 09.07.2010, transitada em 30.09.2010, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão;
- PCS n.º 168/07.5JACBR, condenado pela prática, em 21.03.2007, de um crime de detenção de arma proibida, por decisão de 27.10.2010, transitada em 26.11.2010, na pena de 9 meses de prisão, suspensa na sua execução por 12 meses;
- PCC 2600/07.9PCCBR, condenado pela prática, em 1.1.2007, de crime continuado de extorsão, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão. No âmbito destes autos, veio a ser efectuado o cúmulo jurídico das penas aplicadas ao arguido, vindo a ser condenado na pena única de 6 anos de prisão.
43. O arguido A... tem antecedentes criminais, tendo sido condenado:
- no PCS n.º 184/04.9PTCBR, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguês, um crime de condução sem habilitação legal, um crime de desobediência, praticados no dia 16.12.2004, pelos quais foi condenado, por decisão de 03.05.2005, transitada em 3.05.2005, na pena única de 160 dias de multa, julgada extinta pelo cumprimento;
- posteriormente a estes factos, no PS 31/10.2PFCBR, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, por factos de 5.10.2010, pelo qual foi condenado, por decisão de 15.03.2011, transitada em 23.03.2011, na pena de 80 dias de multa.
44. O arguido A... cresceu numa família de baixo estrato social e económico, com deficiente supervisão parental e um ambiente familiar conflituoso devido aos hábitos alcoólicos do pai. O seu percurso escolar regista reprovações. Aos dezasseis anos começa a trabalhar, fixando-se no sector da construção civil, após outras experiências profissionais, designadamente numa tipografia. Aos dezoito anos passou a viver em união de facto e após o falecimento da companheira na sequência de um acidente de viação, surgem consumos de heroína e cocaína. Desta união tem uma filha que se encontra sob os cuidados dos avós maternos.
*
3. Não se provou, com relevância para a decisão da causa, que:
A) O arguido A..., no ano de 2010, não possuía qualquer actividade profissional; para angariar meios económicos para fazer face às despesas do seu dia-a-dia bem como às despesas com aquisição de estupefacientes, que consumia, dedicava-se, de forma reiterada e sucessiva, à prática de crimes de furto. Era useiro e vezeiro na abertura de viaturas e na subtracção de material nelas colocado, que posteriormente vendia ou trocava, disso fazendo modo de vida;
B) O auto-rádio valia 300,00€;
C) O arguido B...sabia que o arguido A...tinha acabado de subtrair os impressos de cheque.
*
4. Quanto à motivação da decisão de facto, ficou consignado:
A convicção do tribunal para dar os factos como provados alicerçou-se na ponderada conjugação e análise crítica de toda a prova produzida, tendo em conta a conjugação ponderada e crítica dos diversos elementos objectivos que foram carreados aos autos na sua conjugação articulada e na indução que dos mesmos, atentas as regras da normalidade das coisas e experiência de vida, permitem concluir pelo facto probando de forma segura e isenta de qualquer dúvida razoável.
Assim, apesar de o arguido A... não ter comparecido à audiência de julgamento e não ter prestado declarações, a convicção do tribunal no que se refere à sua intervenção nos factos atinentes ao furto no veículo resulta da conjugação efectuada de todos os elementos probatórios atinentes ao ocorrido no dia e momentos após ter ocorrido o furto em apreço.
Concretizemos:
Resulta do depoimento do proprietário do veículo de matrícula … , C..., que a viatura se encontrava estacionada no local desde as 7 horas da manhã, tendo constatado que a mesma havia sido alvo de furto pelas 18 horas do mesmo dia. Por outro lado, resulta dos fotogramas juntos aos autos a fls. 60 a 67, extraídos das gravações efectuadas nesse mesmo dia, no interior da loja onde foi utilizado o cartão WW... (vide ainda relatório de visionamento de fls. 59), que o arguido A... se encontrava no seu interior durante os períodos desse dia em que foram efectuadas as compras com o referido cartão, e que ocorreram por três vezes, sendo a primeira aquisição efectuada às 12.57 (conforme documentos de fls. 23 e 25), outra às 16.01 (conforme documentos de fls. 22 e 24) e outra às 20.05 (conforme fls. 23 e 26), alturas em que o arguido é visualizado no interior da loja (vide ainda relatório de visionamento de fls. 59), uma das quais onde claramente se percepciona o mesmo a transportar um LCD, um dos bens adquiridos com o uso do cartão. Por outro lado, temos que o co-arguido B..., optando por prestar declarações no final da audiência de julgamento, referiu que o arguido A..., que conhecia do meio da toxicodependência, lhe solicitou nesse dia pela manhã (junto às 8/9h) para que o auxiliasse no levantamento do referido cheque. Salienta ainda que o A...o acompanhou até junto do local onde iriam proceder ao levantamento do cheque (Loja do Cidadão), ficando a aguardar por si junto ao Centro Comercial D. Dinis.
A conjugação destas declarações, quanto à posse do cheque em apreço pelo arguido A… , em momento muito próximo da altura em que a viatura foi estacionada no local (cerca de 1 hora depois) e bem assim a subsequente presença do arguido A... na loja da WW..., nos exactos momentos temporais em que ao longo do dia foi utilizado o cartão para adquirir equipamentos, levam-nos a concluir, sem margem para qualquer dúvida razoável, sobre a autoria do furto em apreço por parte do arguido A..., sem que se apresente qualquer justificação ou explicação razoável, à luz das normas da experiência, que permitam infirmar o juízo conclusivo acabado de expor. Será de salientar, ademais, que para além do que vem exposto no relatório de visionamento de fls. 59, a testemunha que o elaborou, … , agente da PSP, referiu-nos em audiência, sem margem para dúvida, conhecer o arguido A...como a pessoa que se visualiza nos fotogramas - confrontar ainda fotografia de fls. 62.
Por outro lado, temos o depoimento prestado pela mãe do arguido B..., a testemunha ..., que esclareceu em audiência de forma objectiva e contundente e merecedora de credibilidade, as circunstâncias em que foi abordada pelo filho e arguido B..., solicitando-lhe o levantamento do cheque. Esta testemunha relatou-nos que acedeu ao pedido do filho porque lhe foi referido por aquele, que tinha arranjado emprego a lavar camiões e que o cheque em apreço era do patrão, versão esta diferenciada daquela que o arguido B...após a audição da mesma carreou aos autos (já que optou por prestar declarações apenas no final da produção de prova) e que não mereceu credibilidade ao tribunal por se mostrar inverosímil e incongruente face à demais prova produzida quanto à forma como os factos ocorreram, designadamente e para além do mais, o expediente e justificações usadas junto de sua mãe para lograr o levantamento do cheque.
O relato efectuado por esta testemunha quanto às circunstâncias em que ocorreu o levantamento e justificação apresentada pelo arguido B...para a convencer sobre a “bondade” do mesmo e desse modo levar aquela a proceder ao levantamento do cheque, conduzem-nos, assim, à convicção segura da intervenção do arguido B..., em conjugação de esforços e vontades com o arguido A...na falsificação do cheque, a que não é alheia a circunstância de o encontro entre os dois arguidos se ter dado, (nas palavras do arguido B...) cerca das 8/9horas e portanto, num momento muito próximo da ocorrência do furto, diríamos, quase imediato ao mesmo (embora não se possa afirmar que o arguido B...tinha conhecimento do mesmo). Por outro lado, é importante referir todo o comportamento do arguido B..., relatado pela sua mãe, relativo ao momento em que esta procede ao levantamento do cheque na CGD, sita no interior da loja do cidadão, designadamente, ficando aquele a aguardar no exterior a saída daquela (o que lhe permitia mais facilmente não ser identificado), a presença do arguido A...nas imediações, para de imediato e assim que recebido o dinheiro irem ambos adquirir produtos estupefacientes com este, já que segundo o arguido B...se encontrava a ressacar, permitindo todo o contexto de toxicodependência em que a situação se dá ajudar a compreender e explicar a forma e finalidade dos factos descritos.
De salientar ainda a análise objectiva do teor do cheque com cópia junta aos autos a fls. 12 (designadamente, da sua frente e verso - no qual consta a assinatura da mãe do arguido B...e data e hora do levantamento), bem como a assinatura aposta no lugar destinado ao titular e que a testemunha C... negou expressamente ser sua. Bem como ainda o teor do documento de fls.30/31, 126 a 128 (relativos ao débito do cartão e prestações do mesmo).
Por seu turno a testemunha … , responsável da loja do Fórum Coimbra, relatou-nos os procedimentos relativos ao cartão WW... para aquisição de bens.
A conjugação de tudo o que vem exposto, aliado às regras da experiência comum e normalidade das coisas e procedimentos, permite de forma congruente concluir pela factualidade dada como provada, nos termos acima indicados.
No que se refere aos bens subtraídos e respectivos valor, bem como aos danos causados, preocupações e incómodos decorrentes para o demandante pela conduta dos arguidos, foram valorados os depoimentos prestados pelo próprio ofendido e também demandante C..., pelo seu genro e filha, … e … , que o acompanharam nas diligências subsequentes ao furto, designadamente com toda a tramitação burocrática relativamente às questões suscitadas com os débitos efectuados com o cartão da WW..., tendo conhecimento das demais diligências havidas e bem assim dos incómodos que a questão suscitou. A testemunha … referiu-nos ainda sobre o valor do auto-rádio, nos termos que vieram a ser consignados nos factos provados, levando à não prova da factualidade referida em B).
No que se refere à situação pessoal dos arguidos, foram valorados o teor dos relatórios sociais de fls. 178 a 185 e, bem assim, quanto aos antecedentes criminais, os CRCs dos arguidos juntos aos autos.
No que se refere à factualidade dada como não provada, a mesma resultou da ausência de prova segura e consistente sobre a atinente factualidade, que lograsse o convencimento do tribunal relativamente à sua verificação.
Impõe-se referir, concretamente no que se refere ao facto dado como não provado na alínea a), que o arguido não apresenta antecedentes criminais quanto à prática de crimes contra o património, não bastando à conclusão aí inserta, o depoimento prestado pelo agente policial, de que o arguido se dedicava àquela actividade.
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5. Mérito do recurso:
Cotejando as conclusões da motivação do recurso, estão expressamente impugnados os pontos n.ºs 9 a 17 do acervo factológico dado como provado pelo tribunal da 1.ª instância, por referência aos meios de prova concretamente indicados, sendo que, quanto à prova oralmente produzida em audiência de discussão e julgamento, estão concretamente referenciadas as passagens consubstanciadoras da impugnação.
Na exegese contida no recurso, ancorada nos meios de prova referidos pelo recorrente (declarações do arguido e depoimento da testemunha ...), os ditos factos carecem de sustentabilidade probatória e, deste modo, devem ser dados como não provados, impondo-se, assim, a absolvição do arguido em relação ao imputado crime de falsificação de documento.
Como se recolhe da tese vertida no recurso, o arguido apenas impugna segmentos dos ditos pontos, na parte em que versam os elementos factuais atinentes àquele crime de falsificação.
Segundo enuncia, não há qualquer prova concreta, quer documental quer oralmente produzida em audiência de julgamento, de que o ora recorrente e o co-arguido A..., conjuntamente, “diligenciaram pelo preenchimento do cheque n.º … , nele fazendo apôr uma assinatura como sendo a do C..., o montante de 50,00 € e a data de 7 de Setembro de 2010, deixando em branco o espaço respeitante ao tomador” (ponto de facto n.º 10).
E acrescenta: não foram provados quaisquer factos, directos ou indirectos, dos quais se possa admitir como provável ser da autoria do ora recorrente a assinatura aposta no cheque, pelo que não pode ser-lhe assacada responsabilidade no crime de falsificação de documento.
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O juízo de convicção firmado pelo tribunal a quo, relevante para dar como provados os factos objecto de impugnação, maxime o do ponto 10, assentou nas declarações do próprio arguido B.... e do demandante C..., conjugadas com o depoimento da testemunha ..., mãe do primeiro, e com o documento de fls. 12 (cópia do título em causa), meios de prova que foram analisados criticamente à luz das regras da experiência comum de vida.
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Importa, então, avaliar da racionalidade e da não arbitrariedade (ou impressionismo) da convicção do tribunal a quo, havendo que apreciar a natureza/conteúdo das provas produzidas e os referidos meios, modos ou processos intelectuais, utilizados e inferidos das regras da experiência comum para a obtenção da anotada conclusão.
Para tanto, vejamos o que a prova oralmente prestada nas duas sessões de julgamento nos revela.
Das declarações do arguido B.... Produzidas na sessão de julgamento do dia 09-01-2012, conforme sistema integrado de gravação digital. extraem-se, em suma, no contexto que importa ter em conta, as seguintes passagens mais marcantes:
- Cruzou-se com pessoa do sexo masculino, cujo nome desconhecia nessa altura (mais tarde veio a saber tratar-se do co-arguido A...), que lhe perguntou se possuía conta bancária. Como a resposta foi positiva, A... pediu-lhe para proceder ao levantamento do cheque com cópia a fls. 12 dos autos. Na sequência de pergunta que lhe dirigiu, A... esclareceu-o sobre a proveniência do cheque. Correspondia ao pagamento de trabalho prestado (lavagem de camiões).
Porém, tentou mas não conseguiu fazê-lo, porquanto não possuía qualquer documento de identificação pessoal;
- Como sua mãe era 2.ª titular da sua conta, solicitou-lhe que se dirigisse a uma dependência da CGD e, aí, depositasse o cheque na referida conta. Disse-lhe o que lhe havia sido revelado pelo co-arguido A.... Esta acedeu. Acompanhou-a à CGD, tendo ficado junto ao balcão de atendimento. Entretanto, sua mãe dirigiu-se à funcionária da CGD a quem referiu aspectos pessoais do ora recorrente, razão por que se retirou do local;
- O dinheiro decorrente do levantamento do cheque destinava-se à aquisição e posterior consumo de produtos estupefacientes pelo declarante e pelo co-arguido A... (“este ofereceu-me alguma coisa para consumir, se eu conseguisse levantar o cheque”; “eu também estava a ressacar na altura; juntou-se o útil ao agradável”);
- Sua mãe deu-lhe o dinheiro “cá em baixo, junto à Loja do Cidadão”; o declarante, por sua vez, acto imediato, entregou-o ao co-arguido A...;
- O cheque já estava “preenchido e assinado” no momento em que lhe foi transmitido por A..... Foi apresentado para depósito ou levantamento nesses precisos termos.

Por seu turno, as declarações da testemunha ... Sessão de julgamento do dia 30-06-2009. assumem, fundamentalmente, os seguintes contornos declarativos:
- Seu filho, o co-arguido B...., pediu-lhe para se dirigir à CGD, na “Loja do Cidadão”, para levantamento de um cheque, tendo argumentado já ter feito uma tentativa nesse sentido, infrutífera porque não possuía documento de identificação. O mesmo sabia que a declarante era titular de uma conta naquela instituição bancária e daí a referida solicitação. Na altura disse-lhe que o cheque era do seu patrão e que o seu trabalho consistia na lavagem de camiões;
- Tratava-se de um cheque ao portador. Supôs que o título tinha de ser depositado na sua conta e só depois levantado a partir desta. No entanto, sem esperar, o funcionário da CGD entregou-lhe o valor inscrito no cheque, ou seja, € 50, quantia que entregou a seu filho, num lugar situado nas imediações da “Loja do Cidadão”;
- Seu filho acompanhou-a à dependência da CGD;
- O cheque foi-lhe entregue, pelo seu filho, já preenchido;
- A letra aposta no cheque não é do co-arguido B..... “Nem de longe nem de perto”; “não é nada parecida”.

Auscultadas as declarações do ofendido/demandante C..., apenas assumem relevância quanto à subtracção dos documentos, impressos de cheques, “em branco”, cartões de crédito e auto-rádio que lhe foram subtraídos do interior de uma viatura automóvel de que é proprietário e sobre o impresso cuja cópia constitui fls. 12 dos autos, o qual foi abusivamente preenchido, além do mais, no que concerne ao valor (€50,00), assinado com o seu nome, por desconhecido(s), e depois levantado.
Também as declarações das restantes testemunhas se revelam totalmente impertinentes quanto à matéria factual em debate.
O cheque com cópia a fls. 12 dos autos somente nos permite apreender que o título, relativo a conta aberta na CGD, titulada por C..., foi preenchido e assinado nos termos que do mesmo constam.
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De nenhum dos aludidos meios de prova decorre a existência de prova directa que permita imputar ao ora recorrente a prática, em co-autoria material ou noutra forma de participação, dos factos, dados como provados, consubstanciadores do crime de falsificação de documento.
Mas relevantes, no domínio probatório, para além dos meios de prova directos, são os procedimentos lógicos para prova indirecta, de conhecimento ou dedução de um facto desconhecido a partir de um facto conhecido: as presunções.
O artigo 349.º do Código Civil prescreve que «presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para afirmar um facto desconhecido», sendo admitidas as presunções judiciais nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal (artigo 351.º do mesmo diploma).
No plano de análise em que nos movemos, importam as chamadas presunções naturais ou hominis, que permitem ao juiz retirar de um facto conhecido ilações para adquiri um facto desconhecido.
«Ao procurar formar a sua convicção acerca dos factos relevantes para a decisão, pode o juiz utilizar a experiência da vida, da qual resulta que um facto é a consequência típica de outro; procede então mediante uma presunção ou regra da experiência (ou de uma prova de primeira aparência)» Cfr., v. g., Vaz Serra, Direito Probatório Material, BMJ n.º 112, pág. 190..
As presunções simples ou naturais são simples meios de convicção, pois que se encontram na base de qualquer juízo. O sistema probatório alicerça-se em grande parte no raciocínio indutivo de um facto desconhecido para um facto conhecido; toda a prova indirecta se faz valer através desta espécie de presunções Cfr. Cavaleiro de Ferreira, Curso de Processo Penal, vol. I, pág. 333 e ss..
As presunções simples ou naturais são, assim, meios lógicos de apreciação das provas, são meios de convicção. Cedem perante a simples dúvida sobre a sua exactidão no caso concreto.
Como é referido no Ac. do STJ de 07-01-2004 In www.dgsi.pt (proc. n.º 03P3213)., «na passagem de um facto conhecido para a aquisição (ou para a prova) do facto desconhecido, têm de intervir, pois, juízos de avaliação através de procedimentos lógicos e intelectuais, que permitam fundadamente afirmar, segundo as regras da experiência, que determinado facto, não anteriormente conhecido nem directamente provado, é a natural consequência, ou resulta com toda a probabilidade próxima da certeza, ou para além de toda a dúvida razoável, de um facto conhecido.
(…)
A ilação decorrente de uma presunção natural não pode, pois, formular-se sem exigências de relativa segurança, especialmente em matéria de prova em processo penam em que é necessária a comprovação da existência dos factos para além de toda a dúvida razoável.
Há-de, pois, existir e ser revelado um percurso intelectual, lógico, sem soluções de descontinuidade, e sem relação demasiado longínqua entre o facto conhecido e o facto adquirido. A existência de espaços vazios no percurso lógico de congruência experimental típica determina um corte na continuidade do raciocínio e retira o juízo do domínio da presunção, remetendo-o para o campo já da mera possibilidade física mais ou menos arbitrária ou dominada pelas impressões».
Em suma, nos parâmetros expostos, a apreciação da prova engloba não apenas os factos probandos apresáveis por prova directa, mas também os factos indiciários, factos interlocutórios ou habilitantes, no sentido de factos que, por deduções e induções objectiváveis a partir deles e tendo por base as referidas regras da experiência, conduzem á prova indirecta daqueles outros factos que constituem o tema de prova. Tudo a partir de um processo lógico-racional que envolve, naturalmente, também elementos subjectivos, inevitáveis no agir e pensar humano, que importa reconhecer, com consistência e maturidade, no sentido de prevenir a arbitrariedade e, ao contrário, permitir que actuem como instrumento de perspicácia e prudência na busca da verdade processualmente possível.
*
Escalpelando o percurso lógico e intelectual seguido na motivação da decisão de facto expressa na decisão recorrida, o tribunal a quo, a partir da objectividade revelada pelo documento que enuncia, em conjugação com as declarações/depoimento acima indicados, extraiu a ilação que a motivação da convicção evidencia.
Mas mal, afigura-se-nos, no que tange aos elementos factuais relativos à co-autoria, pelo recorrente, do crime de falsificação de documento.
Assim, no vertente caso, segundo os julgadores de 1.ª instância, os factos conhecidos (os pressupostos e a base da presunção) são, essencialmente, os elementos recolhidos do depoimento da testemunha ..., relativas ao circunstancialismo, supra descrito, em que foi abordada pelo recorrente tendo em vista o levantamento do cheque, em contraste com as declarações, inverosímeis, do arguido sobre o expediente e justificações usados junto de sua mãe para obtenção dos seus desígnios, a par da concreta situação em que os dois arguidos se encontraram (cerca das 8/9 horas, num momento muito próximo da ocorrência do furto), do comportamento do arguido B...- que ficou a aguardar no exterior da loja do cidadão o levantamento, por sua mãe, do cheque -, e da presença, nas proximidades, do arguido A....
Seguindo de perto as posições da doutrina e da jurisprudência, são elementos da comparticipação criminosa sob a forma de co-autoria:
- a intervenção directa na fase de execução do crime («execução conjunta do facto»);
- o acordo para a realização conjunta do facto; acordo que não pressupõe a participação de todos na elaboração do plano comum de execução do facto; que não tem de ser expresso, podendo manifestar-se através de qualquer comportamento concludente; e que não tem de ser prévio ao início da prestação do contributo do respectivo co-autor;
- o domínio funcional do facto, no sentido de o agente «deter e exercer o domínio positivo do facto típico» ou seja o domínio da sua função, do seu contributo, na realização do tipo, de tal forma que, numa perspectiva ex ante, a omissão desse contributo impediria a realização do facto típico na forma planeada.
No que respeita à execução propriamente dita, não é indispensável nem necessário que cada um dos agentes cometa integralmente o facto punível, que execute todos os factos correspondentes ao preceito incriminador, que intervenha em todos os actos a praticar para obtenção do resultado pretendido, bastando que a actuação de cada um, embora parcial, seja elemento componente do todo e indispensável à produção do resultado.
Ora, as referências do tribunal a quo, ainda que cabalmente demonstradas através das declarações do arguido e da testemunha ..., não permitem concluir, com toda a probabilidade próxima da certeza, que os arguidos A...e B...acordaram entre si o preenchimento do cheque em causa, agindo concertadamente e executando em conjunto, embora parcialmente que seja, a decisão espelhada no ponto 10. da factualidade provada.
No conspecto em análise, apenas se vislumbra uma mera possibilidade física mais ou menos arbitrária, marcada por meras hipóteses e conjecturas, fora do domínio de congruência lógica consentida pela presunção natural.
Daí que, não sendo possível remover a dúvida razoável, positiva, racional, sobre a co-autoria, pelo recorrente, dos factos descritos no ponto 10., impeditiva da convicção do colectivo de 1.ª instância nos termos em que se revelou, deve tal dúvida favorecer o arguido, por força do princípio in dubio pro reo, impondo-se, em consonância, nesse contexto e bem assim quanto ao facto 11. e 16., na parte respectiva, a alteração da matéria de facto.
*
Procedendo à modificação da matéria de facto [cfr. art. 431.º, al. b) do Código de Processo Penal], nos pontos em destaque, os factos provados e não provados passam a ser os seguintes:
Factos provados:
- Mantêm-se inalterados os pontos 1 a 9, 12. a 15. e 17. a 34.
«10. O arguido A...diligenciou pelo preenchimento do cheque n.º 2295408777, nele fazendo apôr uma assinatura como sendo a de C... e o montante de €50,00, a data de 7 de Setembro de 2010, deixando em branco o espaço respeitante ao tomador».
«11. Os arguidos A...e B...combinaram, então, que o segundo ia contactar sua mãe e convencê-la a, por eles, proceder ao levantamento do cheque n.º …
«16. Ao diligenciar pelo preenchimento do impresso de cheque n.º … aposição no mesmo de uma assinatura como sendo a de C... e ao acordar com o arguido B.... a sua apresentação em instituição bancária, o arguido A...sabia que violava a segurança daquele meio de pagamento e a fé pública depositada em tais títulos de crédito e ainda que, mediante tal estratagema, lograva induzir em erro os funcionários bancários».
«16-A. Ao diligenciar, na forma descrita, pela apresentação do impresso de cheque n.º … enchido e assinado nos termos descritos no ponto 10., o arguido B...sabia que, mediante o estratagema definido nos pontos 11. e 13., lograva induzir em erro os funcionários bancários».

Factos não provados:
Para além dos que assim foram considerados, acrescem os seguintes:
«D) O arguido B...diligenciou, conjuntamente com o arguido A..., pelo preenchimento do cheque n.º … la aposição no título dos elementos referidos no ponto 10. da matéria de facto provada»;
«E) Ao diligenciar pelo preenchimento do impresso de cheque n.º … la aposição no mesmo de uma assinatura como sendo a de C..., o arguido B...sabia estar a violar a segurança daquele meio de pagamento e a fé pública depositada em tais títulos de crédito».
*
À alteração da matéria de facto, nos pontos assinalados, foram determinantes os fundamentos que, casuisticamente, em sede própria, ficaram expostos.
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Vista a estrutura típica do crime de falsificação de documento autêntico, manifestamente os factos provados alusivos ao comportamento do arguido B.... não se subsumem ao tipo-norma do artigo 256.º, n.ºs 1, als. c) e d), e 3, do Código Penal, porquanto, como é óbvio, não estão sequer preenchidos os respectivos elementos objectivos.
Daí que, sem maiores considerações, tal a evidência da solução jurídico-penal, se imponha decisão de absolvição do arguido B...quanto à imputada prática do referido crime, ficando, deste modo, prejudicada a apreciação das questões elencadas nas alíneas B), C), E) e F) do n.º 1 da fundamentação deste acórdão.
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Importa apreciar, por fim, a medida da pena no que tange ao crime de burla praticado pelo arguido B.....
Insurge-se o recorrente contra a pena que lhe foi imposta, que tem por quantitativamente excessiva, tendo em conta que, no concreto caso dos autos, está em causa um valor diminuto, que o recorrente, à data da prática dos factos, era toxicodependente, e ainda que o recorrente se encontra em reclusão, mantendo um percurso prisional exemplar, demonstrativo da vontade e capacidade para se ressocializar e seguir o seu caminho longe da prática de ilícitos penais.
Assim, esclarece-se, a opção do tribunal a quo pela pena principal de prisão em detrimento da multa que o tipo de burla simples também prevê (artigo 217.º, n.º 1.º, do CP), não mereceu reparo ao recorrente.
Vejamos se lhe assiste razão.
Preceitua o art. 40.º, do Código Penal, que «a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade” (n.º 1), sendo que “em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa» (n.º 2).
Abstractamente a pena é definida em função da culpa e da prevenção, intervindo, ainda, circunstâncias que não fazendo parte do tipo, atenuam ou agravam a responsabilidade do agente - art. 71.º, n.ºs 1 e 2 do CP.
A função primordial de uma pena, sem embargo dos aspectos decorrentes de uma prevenção especial positiva, consiste na prevenção dos comportamentos danosos incidentes sobre bens jurídicos penalmente protegidos.
O seu limite máximo fixar-se-á, em homenagem à salvaguarda da dignidade humana do condenado, em função da medida da culpa revelada, que assim a delimitará, por maiores que sejam as exigências de carácter preventivo que social e normativamente se imponham.
O seu limite mínimo é dado pelo quantum da pena que em concreto ainda realize eficazmente essa protecção dos bens jurídicos.
Dentro destes dois limites, situar-se-á o espaço possível para resposta às necessidades da reintegração social do agente.
Como refere Claus Roxin, em passagens escritas perfeitamente consonantes com os princípios basilares no nosso direito penal, «a pena não pode ultrapassar na sua duração a medida da culpabilidade mesmo que interesses de tratamento, de segurança ou de intimidação revelem como desenlace uma detenção mais prolongada.
A sensação de justiça, à qual corresponde um grande significado para a estabilização da consciência jurídico-penal, exige que ninguém possa ser castigado mais duramente do que aquilo que merece; e “merecida” é só uma pena de acordo com a culpabilidade.
Certamente a pena não pode ultrapassar a medida da culpabilidade, mas pode não alcançá-la sempre que isso seja permitido pelo fim preventivo. Nele radica uma diferença decisiva frente à teoria da retribuição, que também limita a pena pela medida da culpabilidade, mas que reclama em todo o caso que a dita pena àquela corresponda, com independência de toda a necessidade preventiva.
A pena serve os fins de prevenção especial e geral. Limita-se na sua magnitude pela medida da culpabilidade, mas pode fixar-se abaixo deste limite em tanto quanto o achem necessário as exigências preventivas especiais e a ele não se oponham as exigências mínimas preventivas gerais» Derecho Penal - Parte General, Tomo I, Tradução da 2.ª edição Alemã e notas por Diego-Manuel Luzón Penã, Miguel Díaz Y García Conlledo e Javier de Vicente Remesal, Civitas), págs. 99/101 e 103..
Ao definir a pena o julgador nunca pode eximir-se a uma compreensão da personalidade do arguido, afim de determinar o seu desvalor ético-jurídico e a desconformação com a personalidade suposta pela ordem jurídica-penal, exprimindo a medida dessa desconformação a medida da censura pessoal do agente, e, assim, o critério essencial da medida da pena Prof. Figueiredo Dias, Liberdade, Culpa, Direito Penal, pág. 184..
A submoldura da prevenção geral é fortemente influenciada pela importância dos bens jurídicos a proteger, desempenhando uma função pedagógica através da qual se procura dissuadir as consequências nocivas da prática de futuros crimes e conseguir o reforço da crença colectiva na validade e eficácia das normas, em ordem à defesa da ordem jurídica penal, tal como é interiorizada pela consciência colectiva.
Por sua vez, a prevenção especial positiva ou de socialização responde à necessidade de readaptação social do arguido.
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No processo de determinação da pena que impôs ao arguido (1 ano de prisão), teceu o tribunal a quo as seguintes considerações:
«Vertendo agora a nossa atenção sobre os factores de medida da pena previstos no n.º 2 do citado artigo 71.º do Código Penal, há que considerar a gravidade da ilicitude, indiciada pelo número e grau de violação dos interesses ofendidos, suas consequências e eficácia dos meios utilizados, e que no caso é mediana, tendo em conta os bens jurídicos protegidos e violados com as condutas de cada um dos arguidos, quer relativos à propriedade, quer relativamente aos valores envolvidos com a utilização do cartão (em vários actos) e desconto do cheque, e a fé pública que merecem os documentos (no caso títulos de crédito), colocados em causa com a actuação dos arguidos.
Ao dolo - directo - os arguidos conhecendo o carácter ilícito das suas condutas quiseram praticar os factos.
A ponderar a situação pessoal e vivencial dos arguidos, mormente a sua situação de toxicodependência, os arguidos eram dependentes do consumo de produtos estupefacientes, o que terá certamente implicado uma menor reflexão sobre os actos praticados e terá propiciado a prática dos factos.
Em desfavor do arguido B... não poderá deixar de se considerar, pese embora a ausência de antecedentes criminais à data dos factos, as condenações entretanto sofridas pelo mesmo, em pena de prisão efectiva pela prática de crimes contra o património, revelando uma personalidade com propensão para a prática deste tipo de ilícitos, e acentuadas as necessidades de prevenção especial, o que revela que se mostra inadequada in casu a opção por penas alternativas, designadamente de multa, nos casos em que a mesma é admissível, ou de prisão sem execução.
A salientar ainda a postura do arguido, que não revelou qualquer censura, reflexão ou auto crítica relativamente aos factos em questão, aliás postura consonante com o que nos vem referido no relatório social elaborado».
Na consideração global dos factores enunciados pelo tribunal a quo, com particular destaque para o comportamento anterior do arguido, acentuam-se necessidades de prevenção geral positiva ou de integração e de prevenção especial positiva ou de socialização.
Na verdade, o arguido já sofreu três condenações, duas relativas à prática de crimes contra o património (roubo e extorsão), em penas de prisão, estando presentemente a cumprir a pena conjunta de 6 anos de prisão, decorrente de cúmulo jurídico das penas parcelares relativas àqueles ilícitos e a um crime de detenção de arma proibida.
Não obstante todos os ditos crimes hajam sido cometidos em data anterior à dos factos deste processo, não deixam de se acentuar, ainda assim, patentes necessidades de prevenção geral.
Por outro lado, o arguido apresenta dificuldades de reinserção social, como revela a sua recente dependência de substâncias estupefacientes.
O cometimento do crime de burla, pelo arguido B...., está intimamente associado ao seu estado de toxicodependência, realidade esta de cunho ambivalente. Se por um lado, se vislumbra uma redução na capacidade de controlo de vontade, por outro, também se reconhecem maiores necessidades de prevenção geral positiva ou de integração, de molde a que não fiquem enfraquecidas as expectativas comunitárias na validade da norma violada.
Parafraseando o Ac. do STJ, de 07/04/1999, proferido no processo n.º 1104/98 - 3.ª Secção, “se aquele estado é de molde a poder diminuir, atenuando, a culpa, o que influenciará o máximo inultrapassável da pena, pode aumentar as exigências concretas de prevenção geral e especial”.
O invocado bom comportamento prisional do arguido não tem nenhum valor atenuativo, porquanto corresponde à esperada atitude de qualquer recluso.
A culpa é intensa, posto que o arguido agiu na modalidade mais vincada de dolo (directo).
Sopesando também o pequeno grau de ilicitude, revelado pelo pequeno valor em causa, tudo ponderado, afigura-se-nos mais justa e consentânea com a culpa do arguido a pena de 10 meses de prisão.
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III. Dispositivo:
Posto o que precede, concedendo-se provimento ao recurso, altera-se, na parte respectiva, o acórdão recorrido e, em consequência, decide-se:
- Absolver o arguido B... da prática, em co-autoria material, do crime falsificação de documento autêntico, p. e p. pelo artigo 256.º, n.ºs 1, als. c) e d), e 3 do Código Penal, que lhe está imputado;
- Condenar o mesmo arguido, pela prática, em co-autoria material, de um crime de burla, p. e p. artigo 217.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 10 (dez) meses de prisão.
Mantém-se, no mais, quanto à condenação cível, o decidido no acórdão do tribunal de 1.ª instância.
Sem tributação [artigo 513.º, n.º 1, do CPP, na redacção dada pelo DL 34/2008, de 26.02].
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(Processado e revisto pelo relator, o primeiro signatário)
Coimbra, 27 de Junho de 2012

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(Alberto Mira)

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(Elisa Sales)

http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/73b4de35f64a466f80257a3f0036ea13?OpenDocument

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