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sexta-feira, 29 de junho de 2012

SUSPENSÃO PROVISÓRIA DO PROCESSO ACORDO- Acórdão do Tribunal da Relação do Porto - 20/06/2012


Acórdãos TRP
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
90/11.0GFPRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JOAQUIM GOMES
Descritores: SUSPENSÃO PROVISÓRIA DO PROCESSO
ACORDO

Nº do Documento: RP2012062090/11.0GFPRT.P1
Data do Acordão: 20-06-2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1

Meio Processual: REC PENAL
Decisão: REJEITADO O RECURSO
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO
Área Temática: .

Sumário: I - O actual Código de Processo Penal introduziu no seu artigo 281º o instituto de suspensão provisória do processo, que se insere no que vulgarmente se designa por justiça penal negociada, partindo-se de um postulado de consenso das respectivas partes, assente em ponderações e finalidades de realização de uma justiça restaurativa, quando estejam conexas lesões de natureza civil [Ac. T. R. Porto de 2012/Mar/21];
II – Sendo essência do mesmo o acordo, não pode ser imposto, seja por quem for, designadamente o arguido, o assistente, os demandantes, o Ministério Público e o muito menos o juiz;
III - Isto significa que em nenhum momento o tribunal pode catalisar a suspensão provisória do processo e muito menos impor essa reacção hetero-compositiva ao Ministério Público.
Reclamações:

Decisão Texto Integral: Recurso n.º 90/11.0GFPRT.P1
Relator: Joaquim Correia Gomes; Adjunto: Carlos Espírito Santo

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto

I. RELATÓRIO

1. No PCS n.º 90/11.0GFPRT do 2.º Juízo Criminal do Tribunal de S. M. Feira, em que são:

Recorrente/Arguido: B…

Recorrido: Ministério Público

por sentença proferida em 2011/Jun./13, a fls. 29-30, onde consta apenas o seu dispositivo, em virtude de ter sido proclamada oralmente, o arguido foi condenado pela prática, como autor material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. pelo disposto no artigo 292.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 72 (setenta e dois) dias de multa, com o valor diário de € 10 (dez) euros, bem como na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, de qualquer categoria, durante 5 (cinco) meses.
2. O arguido interpôs recurso por correio electrónico expedido em 2012/Jul./04, a fls. 32-34, apresentando para o efeito as seguintes conclusões:
1.º) Atentas as circunstâncias do crime, a ter ocorrido na sua plenitude, o facto de se tratar de arguido primário, colaborante em audiência de julgamento, dada até a situação familiar e profissional, positivas e de plena inserção social, considera-se que considera-se que foram violados os determinativos da medida da pena (artigo 71.º do CP), os quais deveriam ter sido levados mais em conta, ou seja mais brandamente, pelo tribunal singular, aplicando-se os mínimos legais exigíveis;
2.º) Efectivamente, com a aplicação da pena de três meses de inibição de conduzir e de 20 dias de multa à taxa diária de cinco euros, cumprir-se-iam os pressupostos de prevenção geral e especial a que se devem atender à situação em apreço;
3.º) Sem prescindir, sempre o arguido requereu previamente a suspensão provisória do processo nos termos do artigo 281.º C. P. Penal, já que se encontram cumpridos os requisitos do referido artigo, os quais se encontram plasmados a fls. 101 dos autos. O Tribunal a quo violou o artigo 281.º C. P. Penal ao negar provimento ao requerido o que se requer que seja previamente analisado e sancionado pelo tribunal de recurso.
3. O Ministério Público respondeu em 2011/Nov./22 no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso.
4. Recebidos os autos nesta Relação foram os mesmos autuados em 2012/Mar./23, tendo sido emitido parecer pelo Ministério Público em 2012/Abr./10, igualmente no sentido da improcedência do recurso.
5. Cumpriu-se o disposto no artigo 417.º, n.º 2 do C. P. Penal, tendo-se colhido os vistos legais.
*
O objecto do recurso passa pela questão prévia da suspensão provisória do processo [a)], a medida da pena principal [b)] e da pena acessória [c)].
*
* *
II. FUNDAMENTAÇÃO
a) A suspensão provisória do processo
O Código de Processo Penal ao disciplinar o regime do processo sumário estipula no seu artigo 391.º, que “Em processo sumário só é admissível recurso da sentença ou do despacho que puser termo ao processo”.
Como se pode constatar o recurso do arguido nesta parte não incide sobre a sentença, mas sobre um despacho que foi proferido no início da audiência de julgamento, pelo que o mesmo não é admissível.
Mas mesmo que o fosse também este recurso seria manifestamente improcedente, pelas razões que se passam a indicar.
O actual Código de Processo Penal introduziu no seu artigo 281.º o instituto de suspensão provisória do processo, tendo o mesmo no seu proémio e actualmente a seguinte redacção:
“Se o crime for punível com pena de prisão não superior a cinco anos ou com sanção diferente da prisão, o Ministério Público, oficiosamente ou a requerimento do arguido ou do assistente, determina, com a concordância do juiz de instrução, a suspensão do processo, mediante a imposição ao arguido de injunções e regras de conduta, se se verificarem os seguintes pressupostos:”
Tal instituto insere-se naquilo que actualmente e vulgarmente se designa por justiça penal negociada, partindo-se de um postulado de consenso das respectivas partes, assente em ponderações e finalidades de realização de uma justiça restaurativa, quando estejam conexas lesões de natureza civil [Ac. T. R. Porto de 2012/Mar./21][1].
Estes propósitos político-criminais de privatização do direito e processo penais, que nos tem aproximado do modelo norte americano de “plea bargaining”, surgiram ancorados e catalisados pela Organização das Nações Unidas (ONU), através das Regras Mínimas sobre as medidas não privativas da liberdade, também conhecidas como Regras de Tóquio, aprovadas pela sua Assembleia Geral através da Resolução 45/110, de 14 de Dezembro 1990, sendo de destacar o seu ponto 5.1[2],
Também o Conselho de Ministros do Conselho da Europa na sua Recomendação R (87) 18, de 1987/Set./17 deixou as suas directrizes para simplificação e agilização do processo penal, aproximando-se do modelo “guilty plea” norte-americano.
Tal teve desde logo reflexos ao nível do direito comparado, com destaque para o “Codice di Procedura Penale” italiano de 1988, onde se consagrou o “Giudizio abbreviato” e o “Patteggiamento” [438.º a 448.º] e também para a “Ley de Enjuiciamento Criminal” espanhola, através de um procedimento preliminar ou posterior de “reconocimiento de los hechos” [779.1-5.ª, 801., 655, 781, 784.2, II, 787.1, 800.2, 801, 787, 801.1].
O Código de Processo Penal alemão (StPO) passou igualmente a contemplar as hipóteses de acordo (Verstädignung) [§§ 153, 1, 2, 407 e ss.], enquanto o Código Penal alemão (StGB) introduziu a possibilidade de conciliação através de mecanismos de justiça restaurativa que podem conduzir à atenuação da pena ou mesmo à sua isenção [§ 46a].
O nosso ordenamento jurídico com o Código de Processo Penal de 1987 passou também a conhecer o instituto de suspensão provisória do processo (281.º, 282.º), a par do processo abreviado (391.º-A a 391.º-E) e do processo sumaríssimo (392.º a 398.º), que foram parcialmente revistos com a Lei n.º 48/2007, de 29/Ago..
Por sua vez, o Código Penal veio a consagrar autênticos mecanismos de justiça restaurativa (206.º, n.º 1; 218.º, n.º 4) – foi ainda introduzido o instituto de mediação penal através da Lei n.º 21/2007, que seguiu a Decisão Quadro n.º 2001/220/JAI do Conselho, de 15/Mar.
Como se pode dar conta desta breve leitura de referências que suportou a introdução de mecanismos de justiça penal negociada ou da sua privatização, a essência dos mesmos é o acordo, pelo que nenhum dos mesmos pode ser imposto, seja por quem for, designadamente o arguido, o assistente, os demandantes, o Ministério Público e muito menos o juiz.
Por outro lado, na sequência da filosofia implementadora desta justiça penal negociada e tendo presente que o Ministério Público é o titular do exercício da acção penal (219.º, n.º 1 Constituição; 48.º C. P. Penal), a opção pelo instituto de suspensão provisória do processo reside essencialmente no direito potestativo daquela magistratura em accionar o mesmo, ainda que sob o impulso prévio do arguido ou do assistente.
Isto significa que em nenhum momento o tribunal pode catalisar a suspensão provisória do processo e muito menos impor essa reacção hetero-compositiva ao Ministério Público.
Daí que a pretensão do arguido seja manifestamente improcedente, devendo ser “duplamente” rejeitada e devidamente sancionada (420.º, n.º 1, al. a) e b); n.º 3).
*
b) A medida da pena principal
i) Os dias de multa
O crime de condução em estado de embriaguez da previsão do artigo 292.º, n.º 1 do Código Penal comina “Quem, pelo menos por negligência, conduzir veículo, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, com uma taxa de sangue superior 1,2 g/l, ”, punindo com “pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias, se pena mais grave não lhe couber”, sabendo que o mínimo da pena de prisão é um (1) mês da pena de multa são dez (10) dias (41.º, n.º 1; 47.º, 1 do Código Penal).
Através deste crime pretende-se tutelar imediatamente a segurança da circulação rodoviária em geral e mediatamente os riscos de lesão para a vida, a integridade física e os bens patrimoniais.
Trata-se de um crime de perigo abstracto, o que significa que o perigo não faz parte dos elementos típicos deste ilícito criminal, partindo-se antes da presunção de que o estado de embriaguez, nas suas diversas cambiantes e a partir de uma TAS superior a 1,2 g/l, torna qualquer pessoa inapta para conduzir.
Tal presunção decorre da constatação de que o álcool em excesso produz efeitos destabilizadores em qualquer pessoa, como seja a criação de um estado de imoderada confiança em si próprio, bem como a diminuição da rapidez de reflexos, da capacidade visual e do raciocínio.
Partindo-se desta realidade, a tipificação deste ilícito mostra-se adequada à diminuição dos riscos de circulação de veículos com motor e ajustada às necessidades de protecção tanto da segurança da circulação rodoviária, como de outros bens jurídicos de incidência pessoal, mostrando-se essa tipificação constitucionalmente ajustada, conforme veio recentemente reafirmar o Tribunal Constitucional [Ac TC 95/2011, 16/Fev.].
Por isso se mostra razoável antecipar a correspondente tutela penal dos bens jurídicos aqui em causa, pelo que não se mostra necessário para o cometimento do crime de condução em estado de embriaguez que se verifique alguns dos resultados que se pretende acautelar, como seja a existência de um acidente de viação e a ocorrência de vítimas.
Nesta conformidade, basta adoptar, de modo culposo, a conduta descrita no respectivo tipo legal, que é a condução a partir de uma taxa de alcoolemia no sangue superior a 1,2 g/l para ocorrer a tipificação do crime de condução em estado de embriaguez. Tal crime tanto é cometido dolosamente, como por negligência (art. 13.º e 14.º do Código Penal),
Tanto na determinação da pena, como na sua execução, deve-se atender às finalidades de aplicação de qualquer pena, que consistem na protecção dos bens jurídicos violados e na reintegração do condenado na sociedade, como decorre do artigo 40.º do Código Penal, estando os critérios da sua determinação estabelecidos no art. 71.º, n.º 1 do mesmo diploma.
Isto significa que a pena, enquanto instrumento político-criminal de protecção de bens jurídicos, tem, ao fim e ao cabo, uma função de paz jurídica, típica da prevenção geral, cuja graduação deve ser proporcional à culpa.[3]
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Estes são os consabidos critérios legais para a determinação da pena. Porém, existem a montante e com assento constitucional outros parâmetros que influem nessa determinação, como que condicionando os referenciados critérios legais (40.º, 47.º, n.º 1 e 71.º, n.º 1, Código Penal).
Estamo-nos a referir ao princípio da intervenção mínima do direito penal, com consagração no artigo 18.º, n.º 2 da Constituição, segundo o qual “A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos”.
Também será de atender ao princípio da proporcionalidade das penas, pois de acordo com o artigo 49.º, n.º 3 da CDFUE, “As penas não devem ser desproporcionadas em relação à infracção”.
Tratam-se de princípios imanentes a qualquer Estado de Direito Democrático (2.º Constituição).
Dos mesmos podemos extrair três critérios para a dosimetria das penas, que funcionam como um parâmetro da constitucionalidade da punibilidade, a partir do princípio da proporcionalidade. Este tem sido perspectivado a partir de três sub-princípios: da idoneidade ou adequação (i), da necessidade ou exigibilidade (ii), ambos respeitantes à optimização relativa do que é factualmente possível, e da proporcionalidade em sentido estrito ou da justa medida (iii), o qual se reporta à optimização normativa, seja a propósito dos direitos, liberdades e garantias em geral [Ac. TC 11/83, 285/92, 17/84, 86/94, 99/99, 302/2006, 158/2008[4]], seja especificamente no que concerne às reacções penais [Ac. TC 370/94, 527/95, 958/96, 329/97].
O primeiro desses critérios da idoneidade ou da adequação (Fähigkeit oder Geeignetheit) estabelece a conexão entre a determinação em concreto da pena e os fins das mesmas, de modo que aquela se mostre idónea e suficiente em relação à prossecução dos objectivos pretendidos.
O segundo critério da necessidade ou da exigibilidade (Notwendigkeit oder Erforderlichkeit) leve a que se opte por aquela reacção penal que se revele menos gravosa para os direitos e interesses do condenado, mas que, concomitantemente, se mostre simultaneamente eficaz em relação aos fins das penas.
O terceiro critério que diz respeito à proporcionalidade em sentido estrito ou da justa medida, impele que a respectiva pena se mostre ponderada e equilibrada, procurando-se acautelar o interesse geral da protecção dos bens jurídicos violados, mediante a sua ponderação tanto como os interesses comunitários da defesa da sociedade, como os interesses pessoais do condenado, sempre que estiver em causa a sua ressocialização.
Trata-se de estabelecer uma relação entre os meios possíveis da reacção penal e os fins das penas, mas fazendo-se esse balanceamento por referência às posições jurídicas em confronto, de modo a acautelar-se a paz jurídica.
*
O arguido não contraria a opção pelo tribunal recorrido pela pena de multa, dizendo antes que esta é excessiva, pois deveria situar-se em 20 dias.
Muito embora o grau de culpa seja de difícil quantificação, podemos no entanto estabelecer patamares ao nível da respectiva moldura penal, faseando-a consoante a mesma seja leve, moderada ou elevada.
Nesta conformidade e atendendo que o arguido revelou uma culpa e uma ilicitude moderada ou razoável, a condenação em 72 dias de multa revela-se ajustada, atentos os referidos critérios legais, porquanto a mesma situa-se no segundo terço do referido limite máximo[5].
*
ii) O quantitativo diário
A fixação do valor diário da multa, de acordo com o estabelecido no anterior art. 47.º, n.º 2, podia variar entre 5 e 500 € “em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais”.
Na aferição desse quantitativo diário o julgador, deve não só ter em conta os rendimentos mensais do arguido, sejam próprios ou do que o mesmo beneficie, mas toda a situação económica e financeira de que o mesmo disponha, designadamente o património que se lhe apresente disponível e os seus encargos.
Neste apuramento deve-se atender igualmente que a multa é uma verdadeira reacção criminal de índole económica e não um laxante com repercussões económicas, devendo, por isso, na sua aplicação ser submetida a critérios de igualdade de sacrifícios e ónus.[6]
No que concerne aos encargos e perante o mesmo princípio da igualdade de ónus e sacrifícios, afigura-se-nos que devemos fazer uma consideração diferenciada dos mesmos, distinguindo aqueles que revelam custos indispensáveis para a sustentação do condenado e dos seus familiares dependentes, os quais devem ser deduzidos no rendimento, daqueles que revelam alguma prodigalidade ou luxúria e que não devem beneficiar da mesma ponderação dedutiva, antes pelo contrário.
Tudo isto leva a que se reserve os quantitativos mínimos para aquelas pessoas que vivem abaixo ou no limiar da subsistência, escalonando-se a partir daí todos os demais.
Perante estas considerações, vejamos quais foram os factos relevantes que foram dados como provados pelo tribunal recorrido:
- O arguido é engenheiro, auferindo entre 1400 a 1600 € mensais, vive com os seus progenitores, contribuindo com 450€ relativo a crédito de habitação de obras.
Nesta conformidade, nunca poderia ser fixado um valor diário de 5€, já que este deve ser reservado para as pessoas indigentes, como salientou e justificou o Ministério Público junto nesta Relação no parecer que apresentou.
Por isso, consideramos por demais ajustado o valor diário de 10€ que a “pecar” será apenas por defeito e nunca por excesso.
*
c) A medida da pena acessória
O crime de condução em estado de embriaguez da previsão do artigo 292.º, n.º 1 e 69.º, n.º 1, al. a), ambos do Código Penal, ao nível da sua reacção penal, tem uma dupla consequência jurídico-penal.
Uma a título principal, que corresponde a uma pena de multa ou de prisão e que se encontra cominada no respectivo tipo-legal, e outra com natureza acessória, que, por isso mesmo acompanha aquela outra, a qual consiste na proibição de conduzir veículos com motor, estatuída no citado art. 69.º do Código Penal – aqui se comina que “É condenado na proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre três meses e três anos quem for punido: b) Por crime previsto nos artigos 291.º ou 292.º;”
Assim, o seu pressuposto formal resulta claramente do facto do agente ter sido punido pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez do art. 292.º do Código Penal.
Já o seu pressuposto material reside essencialmente na perigosidade apresentada pelo arguido no exercício da condução de veículos com motor e no estado de embriaguez revelado pela sua TAS.
Trata-se, ao fim e ao cabo, de uma perigosidade que reside na conduta típica do crime de condução em estado de embriaguez e que sobressai das circunstâncias do agente conduzir veículos depois de ter ingerido bebidas alcoólicas em excesso.
Assim, a pena acessória de proibição de conduzir tem uma relevância de prevenção especial, decorrente da perigosidade revelada pela leviandade e imprudência que aquele preciso condutor patenteou, por circular num estado de embriaguez relevante para a segurança rodoviária ou então por ser uma conduta frequente.
Mas também tem um acentuado cariz de prevenção geral de intimidação e de defesa da sociedade, surgindo como uma autêntica advertência para os demais condutores [Ac. R. C. de 1996/Nov./07, CJ V/47].[7]
Mas para se ultrapassar qualquer efeito automático das penas, o julgador deve proceder à aferição da medida concreta da proibição de conduzir, tendo em atenção as apontadas finalidades das penas e os critérios da sua determinação, os quais estão expressos no art. 71.º [Ac. TC n.º 362/92 (DR II 1993/Abr./08); 149/01; 440/02; 630/04].
Assim e muito embora se trate de uma pena acessória, a sua aplicação está sujeita às mesmas finalidades que deve ter qualquer pena, que, como já referimos, visa a protecção dos bens jurídicos violados e o desiderato de atingir a paz jurídica, típica da prevenção geral, cuja graduação deve ser proporcional à culpa, proporcionando a reintegração do agente na sociedade (40.º do Código Penal).
Esses critérios legais, apontam para que, numa primeira fase, a pena seja encontrada em função da culpa do arguido e das exigências de prevenção, atendendo ainda, numa segunda fase, a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, rodearam o mesmo, antes ou depois do seu cometimento, quer resultem a favor ou contra o agente.
Neste sentido se tem pronunciado a generalidade da jurisprudência, como sucede com os Ac. R. E, de 1998/Fev./17 [CJ II/291], 1998/Mar./10[8] [BMJ 475/798], R. C. de 1997/Mai./15, BMJ 467/640, 1999/Jun./02, R. P. de 2000/Nov./29, [CJ III/54 e V/229], referindo-se expressamente neste último que “Esta pena acessória deve ser determinada tendo em conta a culpa do agente e as exigências de prevenção”.
No entanto, convém recordar que as penas acessórias, apesar de decorrerem da necessidade de aplicação de uma pena, seja principal ou substituta desta, desempenham essencialmente uma função preventiva adjuvante daquela, que se dirige mais à perigosidade da personalidade do agente, do que à tutela do bem jurídico violado.[9]
Isto não significa que não se tenha em atenção a TAS revelada pelo agente do crime de condução em estado de embriaguez, porquanto e como já se decidiu “A determinação da medida da pena acessória de inibição de conduzir não pode deixar de ter em conta a taxa de alcoolemia de que o arguido é portador”. “Daí que não tenha qualquer justificação aplicar a um arguido o mínimo legal quando a taxa de álcool no sangue (TAS) com que conduzia um automóvel era de 1,65 g/l” [Ac. R. C. de 2000/Nov./29, CJ V/49].
Por isso, na aplicação das pena acessórias sobressaem mais as razões de prevenção especial, que no caso do crime de condução em estado de embriaguez, dizem essencialmente respeito à segurança rodoviária, face ao perigo provocado pela(s) conduta(s) do agente, do que a sua dimensão de reinserção social.
O facto do arguido precisar de se deslocar de veículo automóvel quando se encontra escalado na fábrica onde trabalha não é um factor de atenuação de perigosidade, mas antes de realçar devidamente a mesma, pois a necessidade de circulação na via pública incrementa o risco do acidente e a condução sob o efeito do álcool é um dos factores potenciadores da sinistralidade rodoviária.
E o arguido já deu “provas” de que a ingestão de álcool não o inibe de conduzir.
Assim, tendo sido determinada uma pena acessória de conduzir veículos por um período de 5 meses, temos a mesma abaixo do limiar mínimo da culpa revelada pelo arguido, pelo que nunca se poderia aceitar os 3 meses que correspondem ao mínimo legal.
*
* *
III. DECISÃO
Nos termos e fundamentos expostos, rejeita-se o recurso interposto pelo arguido B… relativamente ao fundamento descrito sob a alínea a) e nega-se provimento quanto ao demais.

Custas pelo arguido recorrente, fixando-se a taxa de justiça em cinco (5) Ucs, condenando-se ainda o mesmo na sanção de três (3) UCs. (513.º n.º 1, 514.º n.º 2, 420.º, n.º 3 do Código de Processo Penal).

Notifique.

Porto, 20 de Junho de 2012
Joaquim Arménio Correia Gomes
Carlos Manuel Paiva do Espírito Santo
________________
[1] Acessível em www.dgsi.pt e que seguiremos de perto, reproduzindo alguns dos seus excertos.
[2] “5.1. Cuando así proceda y sea compatible con el ordenamiento jurídico, la policía, la fiscalía u otros organismos que se ocupen de casos penales deberán estar facultados para retirar los cargos contra el delincuente si consideran que la protección de la sociedad, la prevención del delito o la promoción del respeto a la ley y los derechos de las víctimas no exigen llevar adelante el caso. A efectos de decidir si corresponde el retiro de los cargos o la institución de actuaciones, en cada ordenamiento jurídico se formulará una serie de criterios bien definidos. En casos de poca importancia el fiscal podrá imponer las medidas adecuadas no privativas de la libertad, según corresponda.”
[3] Veja-se a propósito ROXIN, Claus, Culpabilidad y Prevencion en Derecho Penal, Reus, SA, Madrid, 1981, p. 181; DIAS, Jorge de Figueiredo, Direito Penal Português – As consequências jurídicas do crime, Coimbra Editora, Coimbra, 2005, pp. 72-73; “Sobre o estado actual da doutrina do crime”, na Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano I, 1991, p. 22; PALMA, Maria Fernanda, “As alterações da Parte Geral do Código Penal na revisão de 1995: Desmantelamento, reforço e paralisia da sociedade punitiva”, em Jornadas sobre a revisão do Código Penal, AAFDL, 1998, p. 26, onde se traça as finalidades de punição deste artigo 40.º, com base no § 2 do projecto alternativo alemão (Alternativ-Entwurf).
[4] Acessíveis em www.tribunalconstitucional.pt assim como os demais a que se fizer referência do Tribunal Constitucional.
[5] Muito embora a concretização de uma pena não seja uma mera operação aritmética, como raciocínio da sua medida podíamos situar a culpa leve no primeiro terço, a moderada no seu segundo terço e a culpa elevada no último terço do seu limite máximo.
[6] JESCHECK, H.-H., “Tratado de Derecho Penal”, Vol. II, (1981) p. 1074; DIAS, Jorge de Figueiredo, “Direito Penal Português – As consequências jurídicas do crime” (1993), p. 127 e ss.
[7] Neste sentido JESCHECH, Hans-Heinrich, Tratado de Derecho Penal – Parte General”, Tomo II, Bosch, Barcelona, 1981, p. 1090-1091; dando mais ênfase à função de prevenção geral FIGUEIREDO DIAS, Jorge, “Direito Penal Português – As consequências do crime”, Coimbra Editora, 2005, p. 165; PINTO de ALBUQUERQUE, “Comentário do Código Penal”, Universidade Católica, Lisboa, 2008, p. 225.
[8] Este aresto teve por base o n.º 2 do artigo 12º do dec.-Lei n.º 124/90.
[9] DIAS, Jorge de Figueiredo, “Direito Penal Português – As consequências jurídicas do crime”, Coimbra Editora, Coimbra, 2005, p. 89 e ss.

http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/d1d5ce625d24df5380257583004ee7d7/de44e9a359023afd80257a2b002e1103?OpenDocument

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