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quarta-feira, 3 de agosto de 2011

PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO PELAS OPERADORAS TELEFÓNICAS E A SUA PRESCRIÇÃO - Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa - 16/06/2011

Acórdãos TRL
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
28934/03.3YXLSB.L1-6
Relator: AGUIAR PEREIRA
Descritores: TELEFONE
PRESCRIÇÃO
PRAZO
CLÁUSULA PENAL

Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 16-06-2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S

Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE

Sumário: a) No âmbito da Lei 23/96, de 26 de Julho e do Decreto-Lei 381-A/97, de 30 de Dezembro, os créditos relativos ao preço do serviço telefónico prescrevem no prazo de seis meses após a sua prestação.
b) Porque a cláusula penal fixada para o caso de incumprimento do contrato é acessória em relação à obrigação principal de pagamento do preço dos serviços telefónicos, prescrito o direito ao pagamento do preço, caduca o direito a exigir o pagamento do valor da pena convencional.
( Da responsabilidade do Relator)
Decisão Texto Parcial:

Decisão Texto Integral: EM NOME DO POVO PORTUGUÊS, ACORDAM OS JUÍZES DESEMBARGADORES DA 6ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:

I – RELATÓRIO

Nº do processo: Recurso de Apelação na acção com processo sumário nº 28934/03.3YXLSB.L1
Apelante: B
Apelado: A - Comunicações Pessoais, S A

a) A - Comunicações Pessoais, S A, com sede na Avenida (…) em Lisboa instaurou a presente acção declarativa com processo sumário contra B, solteiro, maior, então residente na Rua .…) – C, actualmente residente na Rua ..., (…) O..., visando, na procedência da acção a sua condenação a pagar-lhe a quantia global de € 9.406,04 (nove mil quatrocentos e seis euros e quatro cêntimos), acrescida da quantia de € 1.044,34 (mil e quarenta e quatro euros e trinta e quatro cêntimos) relativa a juros de mora vencidos e dos juros de mora vincendos.
Alega, em síntese, que:
No exercício da sua actividade de exploração do serviço móvel terrestre contratou com o réu, em 30 de Novembro de 2001, prestar-lhe serviços telefónicos que este deveria pagar no prazo de quinze dias a contar da data das respectivas facturas.
O réu, apesar de instado para o efeito, não procedeu ao pagamento de serviços facturados entre Janeiro e Julho de 2002, no valor global de € 4.782,89 (quatro mil setecentos e oitenta e dois euros e oitenta e nove cêntimos);
O réu celebrou com a autora, em 12 de Outubro de 2001, um contrato segundo o qual deveria permanecer como cliente da autora por um período de vinte e quatro meses, tendo os serviços sido desactivados, por falta de pagamento, em Julho de 2002.
Tal circunstância implicava que o réu procedesse ao pagamento de uma penalidade de valor correspondente ao da totalidade dos valores mensais vincendos até ao termo do prazo.
O réu também não procedeu ao pagamento do valor dessa penalidade.
b) O réu, devidamente citado, deduziu contestação, impugnando todos os factos alegados pela autora e os documentos juntos, alegando que não celebrou com a autora qualquer contrato.
Mais alega que invocando a autora uma dívida anterior a 31 de Julho de 2002 e tendo o réu sido citado apenas em Julho de 2004 se encontra prescrita a dívida invocada, nos termos do artigo 317º do Código Civil e/ou do artigo 10º da Lei 23/96, de 26 de Julho.
c) A autora apresentou articulado de resposta, que conclui como a petição inicial e em que alega a inaplicabilidade do artigo 317º do Código Civil e do artigo 10º da Lei 23/96, de 26 de Julho, aos presentes autos, que sempre enviou mensalmente ao réu as facturas correspondentes aos serviços prestados e que o réu nunca efectuou qualquer pagamento.
d) Foi então proferida decisão que julgou improcedente a invocada excepção de prescrição e ordenou o prosseguimento dos autos.
e) Inconformado com o teor de tal decisão dela interpôs recurso o réu.
Tal recurso viria a ser admitido como de apelação e subida imediata, apesar do disposto no artigo 695º do Código de Processo Civil, ao abrigo do princípio da adequação formal dos actos processuais (artigo 265º-A do Código de Processo Civil).
São do seguinte teor as conclusões das respectivas alegações:
“1. (…), a Autora Recorrida, instaurou acção declarativa de condenação;
2. Foi proferido despacho saneador (…) onde desde logo se decidiu da questão da prescrição invocada pelo Réu, bem como ainda dispensou a selecção da matéria de facto, com base na simplicidade da mesma;
3. (…) a Meritíssima Juiz "a quo" decidiu: "Assim e por tudo o que ficou exposto, indefere-se a invocada excepção da prescrição";
4. Dúvidas não existem de que o despacho recorrido viola o disposto no artigo 10°, nº 1 da Lei 23/96, de 26 de Julho ou o prazo de prescrição prevista na Lei 5/2004, de 30 de Dezembro;
5. Estamos perante o prazo de prescrição prevista no artigo 10°, n° 1 da Lei 23/96, de 26 de Julho, ou seja, o prazo prescricional de seis meses;
6. Para o conhecimento da excepção da prescrição basta que seja alegado o decurso do tempo como causa da extinção do crédito peticionado, para que a mesma seja conhecida, sendo aquele facto integrado no normativo legal que o julgador considere aplicável, ainda que normas não sejam expressamente invocadas pela parte que deduz a excepção, nos termos do artigo 664° Código de Processo Civil;
7. Contrariamente ao decidido, considera o Recorrente que o prazo de prescrição dos montantes aqui reclamados é de seis meses após a prestação do serviço, à luz do disposto nos artigos 10°, nº 1, da Lei 23/96, de 26 de Julho e 9°, n° 4, do D L 381-A/97, de 30 de Dezembro, e não de cinco anos;
8. A Autora e aqui Recorrida intentou a referida acção contra o Réu, em 2003, sendo certo que os factos que estiveram subjacentes à mesma ocorreram no período de Janeiro a Agosto de 2002;
9. Ora, desde a prestação dos serviços até à propositura da acção decorreram mais de seis meses, pelo que, já estava prescrito o direito de reivindicar judicialmente o pagamento dos referidos serviços;
10. Pelo que, dúvidas não existem que nunca o Tribunal "a quo" deveria ter decidido como decidiu;
11. A Lei 23/96, de 26 de Julho, estabelece "as regras a que deve obedecer a prestação de serviços públicos essenciais em ordem à protecção do utente", consagrando que os créditos periódicos provenientes da prestação de serviços públicos essenciais, como o serviço de telefone, prescrevem no prazo de seis meses após a sua prestação;
12. Sendo a referida lei, uma lei especial, que regula especificadamente as regras do serviço de telefone, prevalece sobre a lei geral, nos termos do artigo 7º, nº 3 do Código Civil;
13. Refere o artigo 10°, nº 1 da mencionada lei que, "o direito de exigir o pagamento do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação" ;
14. Também o artigo 9°, nº 4 do D. L. 381-A/97, de 30 de Dezembro estabelece que "o direito de exigir o pagamento do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação”;
15. Ora, no caso concreto a Autora e aqui Recorrida intentou a presente acção já depois de decorrido o prazo de seis meses que tinha, após as prestações dos serviços de telecomunicações;
16. O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nº 1/2010, publicado no DR I, de 21 de Outubro de 2010, uniformizou a jurisprudência neste sentido: "Nos termos do disposto na redacção originária do nº 1 do artigo 10° da Lei nº 23/96, de 26 de Julho, e nº 4 do artigo 9° do Decreto-Lei nº 381-A/97, de 30 de Dezembro, o direito ao pagamento do preço de serviços telefone móvel prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação ";
17. A Lei 5/2004, de 30/12 (Lei das Comunicações Electrónicas), que entrou em vigor em 11/12/2004 (conforme artigo 128°, nº 1) procedeu, no seu artigo 127º, nº I e 2, à revogação do D. L. 381-A/97, de 30/12 e excluiu expressamente do âmbito de aplicação da Lei 23/96, o serviço de telefone;
18. Sobre a aplicação das leis no tempo estabelece o artigo 12° do Código Civil;
19. Perante o disposto no artigo 12°, nº 2, 2ª parte do mesmo diploma normativo, a revogação do D. L. 381-A/97 pela Lei 5/2004, não atinge os serviços de telefone prestados anteriormente à sua entrada em vigor, pelo que aos serviços de telefone prestados até 10 de Fevereiro de 2004, aplica-se o disposto no DL. 381-A/97 e na Lei 23/2006;
20. Com a entrada em vigor das leis 12/2008, de 26 de Fevereiro e 24/2008, de 2 de Junho, o artigo 10° da Lei 23/96 passou a estabelecer que o direito ao recebimento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação e que o prazo para a propositura da acção ou da injunção pelo prestador de serviços é de seis meses, contados após a prestação do serviço;
21. Como explica Calvão da Silva, a nova redacção do artigo 10º da referida lei reveste natureza interpretativa para os serviços de telefone fixo ou telemóvel prestados antes da entrada em vigor da Lei 5/2004, na medida em que consagra um entendimento doutrinário e jurisprudencial anterior e põe termo retroactivamente à incerteza e controvérsia interpretativa;
22. Portanto, e de acordo com o decidido no Ac. da RL, de 12/10/2010, "in" www.dgsi.pt aos serviços de telefone prestados antes da entrada em vigor da Lei 5/2004 aplica-se a prescrição semestral do direito de exigir judicialmente o pagamento do preço;
23. Verifica-se assim que na sentença recorrida efectuou uma incorrecta interpretação e aplicação das normas jurídicas aplicáveis ao caso em concreto;
24. Sofrendo a sentença recorrida de nulidade por violação do disposto nas alíneas c) e d) do nº 1 do artigo 668º do Código de Processo Civil;
25. Nulidade que aqui se invoca com todos os efeitos legais.”
f) Não foram apresentadas contra alegações.
g) Colhidos os vistos legais dos Exmº Juízes Desembargadores adjuntos, cumpre agora apreciar e decidir.

II – FUNDAMENTAÇÃO
A) OS FACTOS
São os seguintes os factos a considerar na decisão a proferir nesta instância:
A autora é uma sociedade comercial que presta serviços no âmbito da exploração do serviço (telefónico) móvel terrestre.
No exercício da sua actividade contratou com o réu a prestação de serviços telefónicos que este deveria pagar no prazo de quinze dias a contar da data das respectivas facturas.
A autora e o réu celebraram em 12 de Outubro de 2001, um acordo especial de fidelização segundo o qual o réu deveria “permanecer na rede ...” como cliente da autora por um período ininterrupto de vinte e quatro meses.
De acordo com a cláusula terceira de tal acordo se o signatário, ora réu, denunciasse ou fizesse cessar a prestação do serviço antes de decorrido o prazo acordado, comprometia-se a efectuar, de imediato, o “pagamento da totalidade dos valores mensais vincendos até ao termo do referido prazo”.
Os serviços prestados ao réu foram desactivados em 31 de Julho de 2002 por falta de pagamento.
A autora emitiu as seguintes facturas:
Em 8 de Janeiro de 2002 a factura ...1010, por serviços prestados (Pack empresa e comunicações) de 1 a 31 de Dezembro de 2001, no valor global de € 1.819,90;
Em 7 de Fevereiro de 2002 a factura …2016, por serviços prestados (Pack empresa e comunicações) de 1 a 31 de Janeiro de 2002, no valor global de € 541,36;
Em 7 de Março de 2002 a factura …3011, por serviços prestados (Pack empresa) de 1 a 28 de Fevereiro de 2002, no valor global de € 541,13;
Em 8 de Abril de 2002 a factura …4019 e por serviços prestados (Pack empresa) de 1 a 31 de Março de 2002, no valor global de € 541,13;
Em 6 de Maio de 2002 a factura …5015, por serviços prestados (Pack empresa) de 1 a 30 de Abril de 2002, no valor global de € 541,13;
Em 4 de Junho de 2002 a factura …6011, por serviços prestados (Pack empresa) de 1 a 31 de Maio de 2002 no valor global de € 249,09;
Em 5 de Julho de 2002 a factura …7018 e por serviços prestados (Pack empresa) de 1 a 30 de Junho de 2002 no valor global de € 549,15,
Em 5 de Agosto de 2002 a factura …8011 e relativa a “penalidade por incumprimento contratual” no valor de € 4.623,15.
A presente acção foi intentada em 29 de Julho de 2003 e o réu foi presumidamente citado em 14 de Julho de 2004.
B) O DIREITO
Importa agora apreciar as questões colocadas nas conclusões das alegações de recurso as quais delimitam, em regra e com ressalva das questões de conhecimento oficioso, o objecto do recurso.
De acordo com elas a questão a decidir é apenas uma, já que a nulidade invocada nos pontos 24 e 25 das conclusões das alegações não encontra o mínimo suporte nas alegações apresentadas: a da prescrição dos créditos invocados pela autora na presente acção.
1. A única questão a decidir é a da prescrição dos créditos invocados pela Autora, incluindo os créditos relativos à alegada prestação de serviços telefónicos e os relativos à reclamada penalização por alegado incumprimento.
De acordo com a decisão impugnada, proferida em data anterior à do acórdão uniformizador de jurisprudência nº 1/2010, do Supremo Tribunal de Justiça, não ocorreu a prescrição.
Funda-se tal decisão na circunstância de, apesar de o prazo prescricional ser de seis meses a partir da prestação do serviço, de acordo com o disposto no artigo 10º da Lei 23/96 de 26 de Julho e no artigo 9º nº 4 do Decreto-Lei 381-A/97 de 30 de Dezembro se dever ter por exigido o pagamento com a apresentação de cada factura, como prevê o nº 5 do citado artigo 9º do Decreto-Lei 381-A/97 de 30 de Dezembro.
Mais se explicita que no caso dos autos as facturas foram enviadas (apresentadas) ao réu dentro do referido prazo de seis meses pelo que o direito de exigir o pagamento só se extinguiria, nos termos do artigo 310º alínea g) do Código Civil, se tivessem decorrido mais de cinco anos sobre a prestação do serviço.
2. A questão da prescrição dos créditos decorrentes da prestação de serviço telefónico foi debatida durante algum tempo na jurisprudência, provocando decisões de sentido oposto, evidenciando as dúvidas que a conjugação do artigo 10º da Lei 23/96, de 26 de Julho (diploma que estabeleceu alguns mecanismos destinados a proteger o utente dos serviços públicos essenciais) e do artigo 9º nº 4 do Decreto-Lei 381-A/97, de 30 de Dezembro suscitavam face aos preceitos relativos à prescrição inseridos no Código Civil.
As divergências jurisprudenciais que então se revelaram foram resolvidas pelo Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº 1 / 2010, do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 3 de Dezembro de 2009 e publicado no Diário da República I Serie de 21 de Janeiro de 2010, o qual veio fixar a seguinte jurisprudência:
“Nos termos do disposto na redacção originária do nº 1 do artigo 10º da Lei nº 23/96, de 26 de Julho e no nº4 do artigo 9º do Decreto-Lei nº 381-A/97, de 30 de Dezembro, o direito ao pagamento do serviço de telefone móvel prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação”.
3. Como bem se decidiu na douta decisão impugnada, a Lei 23/96, de 26 de Julho, na sua redacção original e o Decreto-Lei 381-A/97 de 30 de Dezembro são aplicáveis a estes autos uma vez que os serviços alegadamente prestados pela autora o foram entre Dezembro de 2001 e Junho de 2002.
Na verdade a Lei nº 5/2004, de 10 de Fevereiro - Lei das Comunicações Electrónicas - que estabeleceu o regime jurídico aplicável às redes e serviços de comunicações electrónicas, revogou o Decreto-Lei nº 381-A/97, de 30 de Dezembro, e excluiu o serviço de telefone do âmbito daquela Lei nº 23/96 (cfr. arts. 128, nº 1 e 127, nº 1, al. d) e nº 2). Porém, a Lei nº 12/2008, de 26 de Fevereiro, com intuitos claramente interpretativos, introduziu alterações à Lei nº 23/96, e voltou a incluir os serviços de telefone - fixos ou móveis - nos serviços abrangidos por este diploma, alterando a redacção do seu artigo 10º nº 1 que passou a ter a seguinte redacção: “o direito ao recebimento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses após a sua prestação.”
Assim sendo, e tendo presente o disposto no artigo 12º do Código Civil, somos a concluir que aos créditos resultantes de serviços telefónicos móveis prestados antes da entrada em vigor da Lei nº 5/2004, de 10 de Fevereiro, é aplicável o prazo prescricional de seis meses após a sua prestação, previsto no artigo 10º, nº 1 da Lei nº 23/96, de 26 de Julho e no artigo 9º, nº4, do Decreto-Lei nº 381-A/97, de 30 de Dezembro, sendo irrelevante a sua revogação pela Lei 5/2004, de 10 de Fevereiro.
4. Uma segunda questão debatida na jurisprudência era a da natureza da prescrição prevista nos preceitos em causa: extintiva da obrigação de pagamento, segundo uns e geradora de simples presunção de pagamento, segundo outros.
Também esta questão foi apreciada no já mencionado acórdão uniformizador de jurisprudência e na douta decisão impugnada e, em ambos, correctamente decidida no sentido de que o decurso do prazo de seis meses não faz apenas presumir o pagamento da dívida mas extingue o direito de exigir o pagamento e ao seu recebimento.
5. Aqui chegados importará atentar que a presente acção foi intentada no dia 29 de Julho de 2003, tendo o réu sido citado em 14 de Julho de 2004.
À luz do que vem sendo dito e levando em linha de conta a razão de ser do estabelecimento da prescrição de seis meses para a exigibilidade dos créditos resultantes da prestação de serviço telefónico sobejamente explanadas no acórdão uniformizador de jurisprudência nº 1/2010 do Supremo Tribunal de Justiça e a que se adere, não há dúvida em considerar extinta a obrigação do pagamento dos serviços telefónicos reclamado nestes autos pela autora.
Na douta decisão impugnada, que se louvou no ensinamento do Professor Menezes Cordeiro, considerou-se que o direito de exigir o pagamento referido no artigo 10º nº 1 da Lei 23/96, de 23 de Julho se reportava apenas ao direito de apresentar a factura a pagamento, pelo que, tendo as facturas sido enviadas dentro dos seis meses posteriores à prestação do serviço o prazo de prescrição a considerar passava a ser o prazo de cinco anos previsto no artigo 310º alínea g) do Código Civil para as prestações periodicamente renováveis.
Também esta argumentação foi refutada no acórdão uniformizador de jurisprudência a que se aludiu, salientando que tal interpretação redundaria num alargamento inusitado de prazo (para além dos cinco anos) quando o objectivo do diploma em que a norma interpretanda se insere foi, claramente, o de defesa do utilizador do serviço telefónico encurtando os prazos de vigência do direito a reclamar o pagamento de serviços telefónicos prestados pelas operadoras.
Em conclusão, de acordo as regras relativas à interpretação das leis nada permite concluir que o legislador quis apenas estabelecer no artigo 10º nº 1 da Lei 23/96, de 26 de Julho, um prazo de seis meses para que o operador (credor) pudesse exigir ao utente o pagamento através do acto de apresentação da factura e que o prazo de prescrição da obrigação de pagamento dos créditos por prestação de serviço telefónico é de cinco anos e consta, afinal, do artigo 310º alínea g) do Código Civil.
6. O direito de exigir o pagamento do preço do serviço prestado prescreve no prazo de seis meses, como se disse.
O mesmo parece não suceder, porém, com o crédito decorrente da indemnização convencional por violação da cláusula de fidelidade (nesse sentido o acórdão deste Tribunal da Relação de Lisboa de 15 de Fevereiro de 2011 proferido no processo 3084/08.0YXLSB-A.L2-7 – relator Juiz Desembargador Dr. Gouveia de Barros) que, por definição, não se reporta ao preço do serviço prestado.
7. Em princípio nada obsta a que seja fixada uma pena convencional no âmbito de contratos de prestação de serviço telefónico para funcionar em caso de incumprimento.
Nos termos alegadamente acordados entre as partes foi convencionado que se o réu denunciasse o contrato ou fizesse cessar a prestação do serviço antes de decorrido o prazo acordado, comprometia-se a efectuar, de imediato, o “pagamento da totalidade dos valores mensais vincendos até ao termo do referido prazo”.
Alega a autora na petição inicial que ao deixar de pagar os serviços prestados o réu ficou obrigado ao pagamento da indemnização convencionada por ter feito cessar a prestação do serviço antes do prazo convencionado (não estamos perante caso de denúncia do contrato por parte do utente).
8. Antes de mais importará dizer que a falta de pagamento do preço correspondente aos serviços prestados e já vencido pode, de facto, dar lugar à suspensão do serviço de telecomunicações por parte da autora.
Porém para que tal possa validamente suceder o utente deverá, obrigatoriamente, ser advertido, por escrito, dessa possibilidade, nos termos do disposto no artigo 5º nº 1, 2 e 3 da Lei nº 23/96, com a antecedência mínima de 8 dias, com alusão aos meios disponíveis para evitar a suspensão.
A desactivação do serviço telefónico levada a cabo pela operadora sem o prévio cumprimento de tais formalidades, mesmo que pudesse ser entendida como acto voluntário do utente destinado a fazer cessar a prestação do serviço, não tem acolhimento legal nem, só por si, opera a resolução do contrato de prestação de serviço telefónico (nesse sentido, entre outros, o acórdão deste Tribunal da Relação de Lisboa de 20 de Outubro de 2009 no processo 698/06.6TJLSB.L1-7 – relatora Juíza Desembargadora Dr.ª Maria do Rosário Morgado).
No caso dos autos os factos alegados pela autora afiguram-se manifestamente insuficientes para que se pudesse ter por verificada a condição de funcionamento da cláusula penal invocada pela autora a fundamentar o pedido.
Dito de outro modo, face aos factos alegados pela autora, sempre seria de concluir que o direito a exigir o pagamento da indemnização convencionalmente fixada não existe.
9. Porém, mais relevante do que isso, se se pudesse entender o contrário, sempre haveria que atentar que, prescrita que está a obrigação principal de pagamento dos serviços prestados, caducou a cláusula penal em função da sua acessoriedade em relação àquela obrigação.
Pela sua pertinência em relação ao caso presente transcreve-se a citação feita no acórdão desta mesma secção, proferido em 25 de Fevereiro de 2010 no recurso de apelação nº 1591/08.3TVLSB.L1-6 – relatora Juíza Desembargadora Dr.ª Márcia Portela – da lição de A. Pinto Monteiro “Cláusula Penal e Indemnização” a fls 86 e seguintes:
“A cláusula penal, como já vimos, pressupõe a existência de uma obrigação – provindo, em regra, de contrato -, que é costume designar por obrigação principal, a fim de acentuar melhor a acessoriedade da referida cláusula, a sua dependência relativamente à obrigação cujo inadimplemento sanciona.
Compreende-se que seja assim: a cláusula penal, em qualquer das suas modalidades, é uma estipulação mediante a qual um dos contraentes se obriga a efectuar uma prestação, diferente da devida, no caso de não cumprir ou de não cumprir nos seus precisos termos a obrigação. Trata-se de simples promessa a cumprir no futuro, com carácter eventual, visto que o compromisso assumido só se efectivará - a pena só será exigível - se e na medida em que o devedor não realize, por culpa sua, a prestação a que está vinculado e a que a cláusula se reporta.
A justificação da acessoriedade da cláusula penal não oferece, pois, dificuldades de maior. Esta não é um fim em si mesmo: ao estipular uma cláusula penal, visa-se incentivar o respeito devido à obrigação, de fonte negocial ou imposta por lei, estabelecendo, desde logo, para o efeito, a respectiva sanção, prevenindo a hipótese do seu incumprimento; ou pode ser escopo das partes, tão-só, o de fixar antecipadamente o quantum indemnizatório a que haverá lugar. Seja como for, a existência de uma obrigação surge, assim, via de regra, como pressuposto objectivo da cláusula penal. Daí que a sorte desta fique dependente do destino da primeira.
Sabemos já que a cláusula penal é um meio de estabelecer uma pena. Evidentemente que o desaparecimento da obrigação principal - por nulidade v. g. - arrasta consigo a cláusula penal, implicando, de igual modo, o desaparecimento da pena, que era o seu objecto. Mas pode dar-se o caso de a obrigação ser válida, mantendo-se, consequentemente, a cláusula penal, sem que a pena, ainda assim, seja exigível. Solução que decorrerá ainda do princípio da acessoriedade: é que a pena só é exigível quando não se efectue (ou não se efectue em termos correctos) a prestação que é devida, mostrando-se também necessário que o credor possa, nos termos gerais, reagir contra o inadimplemento. Não sendo este o caso, designadamente porque o incumprimento ou o atraso não são imputáveis ao devedor, não será devida a pena. O credor só pode exigi-la, pois, nos mesmos termos em que poderia reagir contra o inadimplemento, a mora ou o cumprimento defeituoso da prestação: trata-se, ainda, de uma consequência da acessoriedade.
A dependência da cláusula penal relativamente à obrigação cujo inadimplemento sanciona, manifesta-se, pois, em vários momentos, desde que esta se constitui até a sua extinção.
Em primeiro lugar, a cláusula penal requer que a obrigação principal haja sido validamente constituída, pelo que, sendo esta inválida, igual sorte tem aquela cláusula. Por outro lado, as formalidades exigidas para a obrigação principal estendem-se à cláusula penal (art. 810º, nº 2). Por último, extinguindo-se, por qualquer motivo, a obrigação principal, caduca a cláusula penal. Numa palavra: desaparecendo a obrigação, seja porque é nula ou foi anulada, seja porque se extinguiu, desaparece o pressuposto de que a cláusula penal dependia, pelo que esta perde a sua razão de ser».
10. No já mencionado acórdão desta secção, de 25 de Fevereiro de 2010, depois de se salientar, para quem assim não entenda, a estranheza da existência de dois prazos de prescrição diferentes para duas obrigações emergentes do mesmo contrato, remata-se como segue:
“A cláusula penal mais não é que a antecipação de todas as mensalidades que seriam devidas até ao termo do período de vinculação de permanência. Não deixam de ser mensalidades reportadas à prestação de um serviço, embora esse serviço não tenha sido prestado (…).
Se por força do princípio da acessoriedade a cláusula penal está estritamente dependente da obrigação principal (accessorium sequitur principale), faz sentido que o prazo de prescrição seja idêntico, sobretudo quando a penalidade é calculada em função das mensalidades devidas pela prestação do serviço (…).”
Tais considerandos têm perfeito cabimento no caso dos autos, pelo que se conclui que a obrigação de pagamento dos créditos reclamados pela autora se encontra prescrita no que se refere às quantias reclamadas a título de prestação de serviços telefónicos, não sendo igualmente exigível qualquer quantia a título de indemnização convencional por alegado incumprimento consubstanciado na falta de pagamento daquelas quantias.

III – DECISÃO
Pelo exposto acordam em:
1. Revogar a douta decisão impugnada que julgou improcedente a excepção de prescrição dos créditos reclamados pela autora;
2. Declarar procedente tal excepção e considerar inexigíveis os créditos invocados;
3. Absolver o réu do pedido.
4. Condenar a autora nas custas da acção.
Notifique.

Lisboa, 16 de Junho de 2011

Manuel José Aguiar Pereira
José da Ascensão Nunes Lopes
Gilberto Martinho dos Santos Jorge

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/e6e1f17fa82712ff80257583004e3ddc/e6823d3de7db2f0d802578cb003d0f56?OpenDocument

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