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sábado, 9 de julho de 2011

ALIMENTOS DEVIDOS A MENORES, REGULAÇÃO DO PODER PATERNAL, ALTERAÇÃO, REDUÇÃO - Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa - 28/04/2011

Acórdãos TRL
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2921/08.3TBBRR.L1-6
Relator: GILBERTO JORGE
Descritores: ALIMENTOS DEVIDOS A MENORES
REGULAÇÃO DO PODER PATERNAL
ALTERAÇÃO
REDUÇÃO

Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 28-04-2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S

Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE

Sumário: 1. A diminuição de despesas com a escolaridade de um dos filhos menores a par da diminuição dos rendimentos do progenitor são circunstâncias susceptíveis de fundamentar a redução da pensão alimentar, à luz do disposto no art. 2012.º do Código Civil.
( Da responsabilidade do Relator )
Decisão Texto Parcial:

Decisão Texto Integral: ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA

I -Relatório

A. instaurou e fez seguir contra B , ambos com os sinais nos autos, a presente acção de alteração da regulação do poder paternal pedindo que seja alterada a pensão total alimentar dos menores, C e D , no sentido da sua redução para € 600,00, devendo manter-se o regime dos aumentos anuais nos mesmos termos do já previsto anteriormente e que, na sequência da redução, seja oficiado a entidade patronal do requerente do valor da pensão alimentar dos menores, para esta, em conformidade com o decidido, proceder ao desconto da mesma directamente no vencimento do requerente.
Para tanto e em síntese invoca a cláusula 4.ª do acordo homologado de regulação do poder paternal, datado de 01.02.2005, na qual se estabeleceu que atenta a situação de desemprego da mãe dos menores e enquanto se mantiver tal situação, o pai dos menores, ora autor, assume a totalidade do pagamento dos alimentos dos menores, contribuindo com a quantia de € 800,00, actualmente com o valor de € 840,66.
Alega que o montante de € 800,00 de alimentos aos menores foi estabelecido porque, em 2005, os dois menores, C e D , frequentavam a mesma escola particular, onde cada um deles pagava uma mensalidade à volta de € 300,00, além das inscrições, visitas de estudo e actividades extras.
Porém, desde 2006, o menor C passou a frequentar o ensino público.
Sustenta também que, em 2005, os seus rendimentos eram superiores; sendo que, em 2007, as despesas do requerente aumentaram com a aquisição da casa passando a pagar empréstimo hipotecário que solicitou para o efeito e com o aumento do custo da satisfação das suas necessidades básicas.
Adianta receber, não contando com as horas de deslocação, um vencimento líquido no montante de € 2.053,58, com os quais paga € 840,66 de pensão alimentar total aos menores, € 250,00 de pensão alimentar à requerida e € 801,12 de prestação mensal do empréstimo hipotecário para aquisição de habitação.
Restando-lhe € 161,80 para prover a sua subsistência, designadamente, despesas com a sua alimentação, despesas médicas e medicamentosas, consumos de água, luz, gás, TV cabo, vestuário, calçado, produtos de limpeza, de higiene pessoal, dinheiro para poder ter consigo os seus filhos e ainda verba disponível quando se ausenta profissionalmente em trabalho, nomeadamente para poder manter activo o cartão de crédito sem o qual não poderá viajar profissionalmente.
Alega ter colocado, em 2007, a sua situação pessoal à requerida tendo em vista chegarem a acordo para baixar o valor global das pensões alimentares – a dos menores e a da requerida – mas em vão.
Finalmente, adianta que a requerida não tem despesas de habitação porquanto, em sede de divórcio, a casa de morada de família foi-lhe atribuída sem qualquer encargo uma vez que, antes do divórcio, o requerente liquidou o empréstimo hipotecário contraído para a aquisição da casa e posteriormente ambos outorgaram escritura de doação da nua propriedade da fracção a favor dos filhos menores, com reserva de usufruto exclusiva a favor da requerida.
Pelo que o montante da pensão de alimentos dos menores em termos totais, uma vez que a requerida não trabalha, deverá ser reduzido para o montante de € 600,00, devendo o regime dos aumentos anuais manter-se igual ao já estabelecido para o anterior valor.
A requerida apresentou alegação – nos termos e para os efeitos a que alude o art. 182.º n.º 3 da O.T.M. – tendo a final pugnado pela improcedência do pedido.
Para tanto e em síntese alegou não ser verdade que o requerente ganhe menos, tanto que deixou a residência que tinha, em andar autónomo, que lhe era proporcionado graciosamente pelos pais, para comprar um outro andar pelo qual paga cerca de € 800,00 mensais, de amortização de empréstimo.
Acresce que o C não teve influência nos termos do acordo, porque era o avô paterno do menor quem satisfazia o pagamento da propina dele, no Externato …..tendo ficado assente, que o avô pagaria a mensalidade enquanto o C lá estivesse, o que aconteceu até Julho de 2005.
Finalmente, adianta que o requerente decidiu unilateralmente reduzir a pensão o que deu aso à instauração de uma execução especial por dívida de alimentos que pende no mesmo Tribunal, sendo que feita a penhora no vencimento, o requerente desencantou este expediente de alteração da pensão de alimentos.
Realizada a conferência de pais, o Mm.º Juiz a quo tentou o acordo, «(…) o qual não foi possível uma vez que a mãe recusa qualquer redução do montante da pensão de alimentos (…)».
Seguidamente, ambos os progenitores apresentaram as suas alegações, bem como foram juntos aos autos os inquéritos elaborados pelo IRS.
Quanto às alegações apresentadas pelo requerente, este termina-as sustentando que o valor de € 600,00 para os menores é um valor compatível com as necessidades actuais destes, sendo um valor proporcionado aos meios que actualmente o requerente dispõe, pugnando por isso pela alteração do acordo de regulação do poder paternal no que respeita ao montante fixado para alimentos dos menores, passando os mesmos a serem fixados em € 600,00 mensais, mantendo-se o regime dos aumentos anuais da pensão nos termos já anteriormente acordados.
No que diz respeito às alegações apresentadas pela requerida, esta pugna pela manutenção do valor da pensão de alimentos devida aos filhos por, no seu entender, lhes ser absolutamente necessário.
Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento e fixada a matéria de facto considerada como assente – sem reclamações – de seguida foi proferida sentença que julgou improcedente, por não provada, a acção e, em consequência, indeferiu a pretensão do requerente, mantendo a prestação de alimentos fixada, a seu cargo, em benefício dos menores.
Inconformado com tal decisão, dela o requerente interpôs recurso que foi admitido como de apelação, com subida de imediato, nos próprios autos e efeito devolutivo.
São as seguintes as conclusões da respectiva alegação de recurso:
A) No presente recurso está em causa desde logo a decisão proferida pelo Tribunal a quo sobre a matéria de facto constante do quesito 15.º decisão que se impugna nos termos do art. 690.º-A n.ºs 1 e 2 do C.P.C.;
B) A referida decisão sobre a matéria de facto não teve em conta o conteúdo constante da prova documental contida na declaração emitida pelo I--, recibos de vencimento e demonstração de liquidação do IRS de 2006, 2007 e 2008, documentos que infirmam a resposta dada ao quesito cuja decisão está em causa pelo presente;
C) O Tribunal a quo na decisão de facto que proferiu quanto à matéria dos rendimentos do recorrente, baseou-se numa errada e deficiente interpretação dos mesmos, limitou a sua convicção em documentos que contém verbas não remuneratórias destinadas a reembolso para a entidade patronal após encontro de contas, desconsiderando os restantes recibos de vencimento e de demonstração de liquidação de IRS, bem como claramente errou na menção do correcto salário do recorrente e da sua correcta composição, em clara contradição com documentos existente nos autos;
D) Perante os assinalados erros e incorrecta análise na factualidade vertida no quesito 15.º, deve a mesma ser alterada em conformidade com a prova efectivamente produzida e constante dos autos, corrigindo-se o valor do vencimento mensal ilíquido do recorrente no montante de € 3.264,00 e a composição do seu salário, ao qual acresce mensalmente subsídio de refeição no montante de € 5,00 pago por dia de trabalho efectivo do recorrente e subsídio de estudo no montante de € 19,96;
E) Deve ainda decidir-se que o recorrente recebe frequentemente mas não mensalmente horas de deslocação, referentes a deslocações efectuadas fora das horas definidas como horário normal de trabalho e que só durante os meses de trabalho na Noruega é que excepcionalmente auferiu horas extraordinárias, ajudas de custo e isenção de horário;
F) Deverá ainda decidir-se no sentido que os recibos de Junho, Julho e Agosto, incluem nos valores a receber valores relativos a regularização de viagem que não são remuneração;
G) A procedência da impugnação da decisão da matéria de facto supra especificada resultará uma clarificação e correcção de erros e permitirá tornar correctos os factos e a consequente decisão final que os mesmos fundamentam;
H) A sentença sub judice faz uma errada interpretação dos factos e do Direito e omite a apreciação em concreto dos reais rendimentos e proventos do recorrente;
I) O recorrente prova a sua falta de possibilidade, como devedor de alimentos, de os continuar a pagar na medida em que o faz e como lhe competia nos termos do artigo 342.º n.º 1 do C.C.:
J) Provado que o recorrente paga um valor total de pensões de alimentos no montante mensal de € 1.107,47 e ainda suporta a prestação hipotecária referente à aquisição da casa onde actualmente habita além das restantes despesas com a sua sobrevivência;
K) Provado que, o recorrente actualmente, depende apenas e só da sua actividade profissional por conta de outrem como engenheiro de materiais no I-- – Instituto da ...;
L) Provado através do IRS, demonstração da liquidação, que o rendimento colectável do recorrente tem diminuído substancialmente desde 2006 até 2008, depois de deduzido ao rendimento global as “deduções específicas” – os pagamentos para a segurança social e os “abatimentos” que são as pensões de alimentos pagas;
M) Descontando ao valor colectável o das retenções na fonte, o valor com que o recorrente fica em termos reais para pagar as suas despesas e responsabilidades é manifestamente insuficiente;
N) A alteração legislativa introduzida pela Lei n.º 64-A/2008 de 31.12, a ter em consideração no ano fiscal de 2009, piora a situação fiscal do recorrente, porque os “abatimentos” por pensões de alimentos deixam de ser feitos ao rendimento global (antiga redacção do art. 56.º do CIRS) e passam a ser abatidos à colecta, na proporção de 20 %, como estatui o art. 83.º-A do CIRS, o que significa que o rendimento colectável do recorrente será substancialmente aumentado (virtualmente apenas!), irá pagar mais IRS a final mas terá menos dinheiro efectivamente disponível;
O) O rendimento real do recorrente tem vindo a diminuir ao longo dos anos;
P) Em contrapartida, a recorrida, pessoa saudável, licenciada em Biologia, que vive em casa totalmente paga, não paga IRS por estar isenta, não trabalha desde o divórcio, apesar de nada ter alegado no sentido da sua impossibilidade para angariar através do seu trabalho, os proventos para o seu sustento e colaborar no sustento dos filhos;
Q) Nos termos constantes dos artigos 2003.º e 2004.º n.º 1, a prova da impossibilidade do devedor de alimentos os continuar a prestar na medida dos actualmente prestados, a calcular em concreto e não em abstracto, deveria ter sido considerada sobejamente provada pela abundante prova documental junta aos autos;
R) A insuficiência económica do recorrente para prover ao seu sustento de forma condigna com a sua condição e necessidade está demonstrada mas não reconhecida na decisão;
S) Por outro lado, as pessoas vinculadas legalmente a alimentos não se reduzem ao ex-cônjuge nos termos do art. 2010.º do C.C., pelo que mesmo que se venha a entender que a medida dos alimentos dos menores é necessária, tal não deve obstar à justa decisão deste pleito que terá que afirmar a incapacidade do recorrente para continuar a prestar os alimentos a estes na medida em que os presta, sem por em perigo a sua condição com o mínimo exigível de dignidade;
T) Portanto, tal não implica um juízo definitivo e absoluto de desmerecimento das necessidades básicas dos menores;
U) Nos termos do art. 2012.º do C.C. (e 2004.º do C.C.) terá que se considerar que houve uma alteração das condições objectivas e subjectivas que determinaram a fixação da pensão alimentar dos menores em 2005, porquanto diminuíram as possibilidades do obrigado e as despesas dos menores diminuíram com a transição de um dos menores para o ensino público. Os encargos do devedor, porque afectam a sua disponibilidade para satisfazer a prestação alimentícia, representam factos constitutivos do seu direito provados na presente acção e nos termos do art. 342.º n.º 1 do C.C.;
V) A sentença a quo posterga tudo o sobredito e faz uma errada aplicação das normas jurídicas que estatuem a presente matéria, em concreto os arts. 2003.º e 2004.º n.º 1 todos do C.C., pelo que não tem condições para sobreviver, devendo assim este Superior Tribunal decidir pela redução pedida do montante de alimentos dos menores, passando a mesma a ser fixada em € 600,00/mês.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser alterada a decisão sobre a matéria de facto relativamente ao quesito mencionado, enquadrados os factos no direito e produzido acórdão que anule a decisão da 1.ª instância e substitua por outra que julgue e defira a pretensão do recorrente nos termos peticionados.
A requerida também apresentou contra alegações que vieram a ser desentranhadas e devolvidas à recorrida por não ter comprovado o pagamento da taxa de justiça devida e respectiva multa nem junto documento comprovativo da concessão de apoio judiciário – cfr. despacho proferido pelo Mm.º Juiz do Tribunal recorrido a fls. 294.
Notificado o M.ºP.º das alegações do recorrente, para responder, querendo, nada disse ou requereu.
Colhidos os vistos legais dos Exm.ºs Juízes Desembargadores Adjuntos cumpre agora apreciar e decidir ao que nada obsta.

II –
Fundamentação de facto
São os seguintes os factos dados como provados na sentença recorrida:
1. Os menores, C , nascido a ... de ... de 1995 e D , nascida a ... de ... de 2002, são filhos de A e de B .
2. No âmbito do processo de divórcio por mútuo consentimento n.º 10/2005, que correu termos na Conservatória do Registo Civil de…. foi decretado o divórcio entre A e B , em 8 de Março de 2005, decisão que transitou de imediato.
3. No âmbito do acordo de regulação das responsabilidades parentais celebrado no divórcio, devidamente homologado, foi regulado o exercício das responsabilidades parentais dos menores, os quais ficaram confiados à guarda e cuidados da mãe e a ela deferido o poder paternal.
4. Mais acordaram, na cláusula 4.ª desse acordo, o seguinte: “Atenta a situação de desemprego da mãe dos menores e enquanto se mantiver tal situação, o pai dos menores assume a totalidade do pagamento dos alimentos dos menores, contribuindo com a quantia de € 800,00 (oitocentos euros) por mês para os menores, devendo tal pensão ser paga até ao último dia de cada mês, através de depósito ou transferência bancária para a conta da Caixa Geral de Depósitos – balcão da ..., com o n.º ...”.
5. Essa prestação seria actualizada anualmente de acordo com o aumento salarial do pai dos menores.
6. Actualmente essa mensalidade é de € 857,47, valor que o requerente paga por desconto no seu vencimento.
7. O requerente ficou também obrigado, na sequência do acordo de alimentos entre os cônjuges celebrado aquando do referido processo de divórcio, a pagar à requerida, mãe dos menores, o montante mensal de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros) a título de alimentos, valor que lhe é igualmente descontado no seu vencimento.
8. A mãe dos menores é licenciada em Biologia, não exerce qualquer actividade profissional e vive da pensão de alimentos dos filhos menores e da sua pensão de alimentos, nos valores referidos em 6) e 7).
9. A requerida vive apenas com os menores, em casa própria, que pertenceu ao ex-casal, não suportando qualquer prestação ou renda com a mesma.
10. O menor C frequenta o 9.º ano de escolaridade na escola pública …...
11. E frequenta o Instituto de Inglês, no …., há três anos, suportando a requerida € 55,00/mês.
12. E anda na natação, suportando a requerida mais € 22,00/mês por essa actividade.
13. A menor D frequenta o Externato…, no …., desde os anos lectivos 2008/2009, estando actualmente no 2.º ano do ensino básico, suportando a requerida cerca de € 300,00 mensais por essa frequência.
14. O requerente depende apenas da sua actividade profissional por conta de outrem, como Engenheiro de Materiais no ….Instituto da…….
15. Onde aufere o vencimento mensal ilíquido de € 3.624,00, ao que acresce a quantia mensal de € 100,00 de subsídio de refeição, bem como outras prestações mensais de valor variável, nomeadamente “horas de deslocação”, sempre que se desloca profissionalmente foras das horas definidas como o horário normal de trabalho, e o subsídio mensal de estudo de € 19,96 para os menores, horas extraordinárias, tendo auferido, em termos líquidos e depois de deduzidos os descontos judiciais dos alimentos para os filhos (€ 857,47) e para a ré (€ 250,00), nos meses de Junho € 3.721,31, Julho € 4.166,55, Agosto € 7.355,83, Setembro € 1.383,31, Outubro € 1.237,00, Novembro € 537,00 e Dezembro € 1.559, 19, todos do ano de 2009.E auferiu em Janeiro € 1.152,45 e Fevereiro € 1.223,28, do corrente ano de 2010.
16. Nos anos de 2007, 2008 e 2009 o requerente auferiu o total ilíquido de € 41. 983,20, € 46.157,33 e € 55.165,19 respectivamente.
17. O requerente vive sózinho em casa própria que adquiriu em 16 de Abril de 2008, mediante empréstimo bancário, e suportava, em Agosto de 2008, a prestação mensal de € 801,12 para amortização desse empréstimo, sendo que actualmente essa prestação é de cerca de € 600,00.

III –
Fundamentação de direito
O âmbito do recurso afere-se pelas conclusões da alegação do recorrente – arts. 660.º n.º 2, 684.º n.º 3 e 685.º-A, todos do C.P.Civil – apenas havendo que conhecer das questões aí colocadas, salvo as de conhecimento oficioso.
Assim, atento o teor das conclusões formuladas pelo apelante, as únicas questões submetidas à apreciação deste Tribunal reconduzem-se à alteração da decisão da matéria de facto contida no ponto 15 da fundamentação de facto e à alteração/redução do montante da prestação alimentar a favor dos menores, C e D filhos dos litigantes.
*
Alteração da decisão da matéria de facto
O apelante não se conforma com a factualidade dada como provada, descrita no ponto 15 da fundamentação de facto, por entender que, face à prova documental, a matéria fáctica aí provada teria necessariamente de ser diferente.
O ponto 15 da matéria fáctica provada tem a seguinte redacção:
«Onde aufere o vencimento mensal ilíquido de € 3.624,00, ao que acresce a quantia mensal de € 100,00 de subsídio de refeição, bem como outras prestações mensais de valor variável, nomeadamente “horas de deslocação”, sempre que se desloca profissionalmente foras das horas definidas como o horário normal de trabalho, e o subsídio mensal de estudo de € 19,96 para os menores, horas extraordinárias, tendo auferido, em termos líquidos e depois de deduzidos os descontos judiciais dos alimentos para os filhos (€ 857,47) e para a ré (€ 250,00), nos meses de Junho € 3.721,31, Julho € 4.166,55, Agosto € 7.355,83, Setembro € 1.383,31, Outubro € 1.237,00, Novembro € 537,00 e Dezembro € 1.559, 19, todos do ano de 2009.E auferiu em Janeiro € 1.152,45 e Fevereiro € 1.223,28, do corrente ano de 2010».
Consultando o despacho de fundamentação da matéria de facto dele consta, na parte que agora nos ocupa, o seguinte:
«(…)
O Tribunal firmou a sua convicção tendo em conta o conjunto da prova documental junta aos autos, nomeadamente nos documentos de fls. 162 a 163, 229 a 232 e recibos juntos em audiência, quanto aos rendimentos e situação profissional do requerente.
(…)
E no depoimento das testemunhas inquiridas, progenitores e irmão do requerente que confirmaram que ele não aufere rendimentos de qualquer outra actividade, a sua situação social e económica, bem como da situação escolar dos menores e declarações da requerida, em audiência, quanto à sua situação socio-económica a situação escolar dos filhos e despesas mensais que com eles suporta.
(…)».
O apelante discorda da referida matéria de facto contida no ponto 15 dos factos provados devendo, na sua perspectiva, ser alterada em conformidade com a prova efectivamente produzida e constante dos autos “… corrigindo-se o valor do vencimento mensal ilíquido do recorrente para o montante de € 3.264,00 e a composição do seu salário, ao qual acresce mensalmente subsídio de refeição no montante de € 5,00/dia, pago por dia de trabalho efectivo do recorrente e subsídio de estudo no montante de € 19,96, …, devendo decidir-se que o recorrente recebe frequentemente mas não mensalmente horas de deslocação, referentes a deslocações efectuadas fora das horas definidas como horário normal de trabalho e que só durante os meses de trabalho na Noruega é que excepcionalmente auferiu horas extraordinárias, ajudas de custo e isenção de horário, …, devendo ainda decidir-se no sentido que os recibos de Junho, Julho e Agosto, incluem nos valores a receber valores relativos a regularização de viagem que não são remuneração…”.
Vejamos, adiantando desde já que a discordância do recorrente merece acolhimento face à prova documental junta aos autos.
Consta do ponto 15 dos factos provados que o vencimento mensal ilíquido do recorrente é de € 3.624,00.
Ora, da leitura da declaração emitida pelo Instituto ... , 1 de Junho de 2009, resulta que “… o referido funcionário efectivo deste Instituto, cuja admissão ocorreu em 15 de Setembro de 1996, aufere um vencimento mensal ilíquido de € 3.264,00…”.
Tal como nos recibos de vencimento está escrito que o vencimento é no montante de € 3.264,00.
Consta também do referido ponto 15 que ao vencimento mensal ilíquido acresce a quantia mensal de € 100,00 de subsídio de refeição.
Acontece que o subsídio de refeição é de € 5,00 diários sendo pago em função do número de dias de trabalho efectivo, conforme se alcança da leitura dos documentos dos autos, nomeadamente dos recibos de vencimento, em que está escrito, por exemplo, no referente ao mês de Junho/2009, “… Subsídio de refeição, 18 unidades, € 90,00…”.
Como refere o apelante nas alegações de recurso “… o subsídio de refeição mensal não é um valor certo, mas sim um valor variável e que pode variar entre os € 5,00 e os € 100,00/mês …”.
Finalmente, consta ainda do mencionado ponto 15 que “… o requerente auferiu, em termos líquidos e depois de deduzidos os descontos judiciais dos alimentos para os filhos (€ 857,47) e para a ré (€ 250,00), nos meses de Junho € 3.721,31, Julho € 4.166,55, Agosto € 7.355,83, Setembro € 1.383,31, Outubro € 1.237,00, Novembro € 537,00 e Dezembro € 1.559,19, todos do ano de 2009. E auferiu em Janeiro € 1.152,45 e Fevereiro € 1.223,28, do corrente ano de 2010…”.
Sucede que da análise dos documentos constantes dos autos resulta uma realidade bem diferente daquela que vem descrita e dada como provada no aludido ponto 15.
A este propósito escreveu o apelante nas alegações de recurso:
- “… A remuneração auferida pelo recorrente nos meses de Maio, Junho e Julho, espelhada nos recibos dos meses de Junho, Julho e Agosto, teve um carácter absolutamente excepcional. Carácter excepcional confirmado pela entidade patronal do recorrente na carta que dirigiu ao tribunal a acompanhar os recibos de Junho/Julho/Agosto /2009…”;
- “… Assim, nos valores que a douta sentença recorrida chama vencimentos, por constarem do recibo do recorrente de Junho, Julho e Agosto, não são totalmente vencimentos, porquanto nos mesmos se encontram incluídos valores de regularização de viagem que não são remuneração. Assim, nos recibos de Julho/2009 e de Agosto/2009, a título de regularização de viagem estão creditados os seguintes valores: € 1.433,36 e € 6.071,04, num total de € 7.504,40…”;
- “… Os montantes referentes ao item “regularização de viagem” que aparecem a crédito nos 3 meses referidos e no âmbito da estadia do recorrente na Noruega em trabalho, são como se percebe adiantamentos que o I---. faz ao trabalhador sobre os quais mais tarde exige a prestação de contas e debita no mesmo vencimento com o descritivo “adiantamento caixa”. Tal é perfeitamente perceptível no recibo de Novembro/2009, mês em que o recorrente recebe o subsídio de Natal e no qual recebeu efectivamente um vencimento do montante de € 537,38. Tal aconteceu por ter sido nesse mês que o I---. debitou no vencimento do recorrente sobre o item “adiantamentos caixa”, os montantes que havia creditado ao mesmo por conta das “regularizações de viajem”, após efectuados os respectivos encontro de contas ….”;
- “… Dos documentos juntos verifica-se que no mês de Novembro/2009 são retirados/deduzidos ao recorrente valores que este havia recebido de adiantamento e regularização de viagem, recebendo no mês em questão um vencimento no valor de € 537,98 (absorvendo as deduções praticamente o valor do seu ordenado e subsídio de Natal), manifestamente insuficiente para pagar as despesas mensais do recorrente …”;
- “… Assim, a sentença a quo que, in totum, fundamentou a sua decisão no valor pago ao recorrente nesses meses, como se de remuneração se tratasse, decidiu erradamente e sem prestar qualquer atenção aos documentos juntos aos autos perfeitamente esclarecedores sobre as verbas incluídas nos mesmos, nomeadamente as referentes a “regularizações de viagem” e “adiantamento de caixa” …”.
Com efeito, estas incorrecções/desconformidades salientadas pelo recorrente são detectáveis perante o exame aos documentos juntos aos autos, caso dos recibos de vencimento dos meses de Junho, Julho e Agosto de 2009 e requerimento do I---., datado de 17.09.2009, onde se pode ler “… juntamos os recibos de vencimento dos últimos 3 meses do nosso colaborador A , …, Informamos que o colaborador neste período esteve deslocado na Noruega a exercer funções num projecto do qual o I---. era parte, daí ter recebido as despesas de deslocações, ajudas de custo e a atribuição de isenção de horário de trabalho, …, Mais informamos que o colaborador presentemente já não se encontra deslocado, não auferindo actualmente os referidos complementos salariais…”.
Pelo que – como refere o apelante nas alegações de recurso – a factualidade provada no ponto 15 está errada nos seguintes pontos: - valor ilíquido da remuneração do recorrente; - referência ao subsídio de refeição como um valor certo mensal; - referência ao recebimento mensal de horas de deslocação e de horas extraordinárias; - e os valores indicados como remuneração nos meses de Junho, Julho e Agosto, com referência aos meses de Maio, Junho e Julho.
Tudo visto, impõe-se, pois, alterar a matéria vertida no ponto 15 dos factos provados que passará a ter a seguinte redacção:
«O vencimento mensal ilíquido do requerente, A , é de € 3.264,00, a que acresce o subsídio de estudo no valor mensal de € 19,96 e ainda o subsídio de refeição no valor de € 5,00 por dia de trabalho efectivamente prestado. Acrescendo também o pagamento de horas extraordinárias e ajudas de custo, sem periodicidade mensal, apenas devidas sempre e quando o requerente efectivamente as faz».
*
Quanto à alteração/redução do montante da prestação alimentar a favor dos filhos menores, C e D , respectivamente, com 16 e 9 anos de idade.
No caso em análise, o fundamento invocado pelo requerente/recorrente para a pretendida redução do montante da pensão de alimentos aos filhos menores, C e D , de € 800,00 actualmente de € 857,47/mês para € 600,00/mês, assenta nas seguintes circunstâncias:
- O menor C passou a frequentar o ensino público em vez do particular cuja mensalidade era de € 300,00 tendo por isso diminuído as despesas dos menores, nesse particular;
- Em 2007, as despesas do requerente aumentaram com a aquisição de casa uma vez que passou a pagar empréstimo bancário no montante de € 600,00/mês;
- A partir de 2007, os rendimentos provenientes do trabalho do requerente têm vindo a diminuir.
Como é sabido os filhos estão sujeitos ao poder paternal até à maioridade ou emancipação – art. 1877.º do C.Civil.
Competindo aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros, e administrar os seus bens – art. 1878.º n.º 1 do mesmo diploma legal.
A lei considera alimentos tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário; sendo que os alimentos compreendem também a instrução e educação do alimentado no caso de este ser menor – art. 2003.º n.ºs 1 e 2 do citado diploma.
Salientando o Prof. Vaz Serra (in anotação ao acordão de 21.06.68, RLJ 102, ano 1969-1970, n.º 3398, pág. 262) que “… parece dever considerar-se como alimentos tudo o que é indispensável à satisfação das necessidades da vida segundo a situação social do alimentando, para o que bastará dar à palavra “sustento” um significado largo ou atribuir carácter exemplificativo ao disposto nos referidos artigos. O que é essencial é que o alimentando careça de alimentos para as necessidades da vida, … de harmonia com a sua posição ou condição…”.
Pelo que respeita à sua quantificação serão eles proporcionados aos meios de quem houver de prestá-los e à necessidade do que houver de recebê-los, devendo, ainda, ter-se em conta, na sua fixação a possibilidade de o alimentado prover à respectiva subsistência – art. 2004.º do citado diploma legal.
Por seu turno, prescreve o art. 2012.º do mesmo diploma legal que se, depois de fixados os alimentos pelo tribunal ou por acordo dos interessados, as circunstâncias determinantes da sua fixação se modificarem, podem os alimentos taxados ser reduzidos ou aumentados, conforme os casos, ou podem outras pessoas serem obrigadas a prestá-los.
Dispondo o art. 342.º n.º 1 do C.Civil que àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.
Pelo que – como refere o apelante nas alegações de recurso – “… a prova da situação económico-financeira do recorrente encontra-se na área dos factos constitutivos o direito por este arrogado, sobre quem recai o ónus da prova da sua insuficiência económica para prover ao seu sustento com um mínimo de dignidade, aferida em função das suas despesas pessoais e necessidade laborais que não pode deixar de cumprir por deter uma situação financeira pessoal incompatível com o assumir dos seus compromissos profissionais…”.
Revertendo ao caso concreto, constata-se ter o menor C passado a frequentar a escola pública, no …., permanecendo apenas a irmã D na escola privada cuja mensalidade se cifra em € 300,00.
Perante a mudança de estabelecimento de ensino, operou-se uma redução da despesa com a escolaridade do C se tivermos em conta que, aquando da celebração do acordo de regulação do poder paternal, em 01.02.2005, os irmãos frequentavam o mesmo estabelecimento de ensino particular.
Por outro lado, em 2007, o pai do C e da D adquiriu casa própria para sua habitação mediante empréstimo bancário cuja prestação mensal é de € 600,00.
Em face desta aquisição, o pai passou a ter maior despesa, uma vez que, à data da celebração do acordo de regulação do poder paternal, em 01.02.2005, o requerente residia num andar proporcionado graciosamente pelos pais deste (vide artigo 9.º da resposta da requerida na sequência da citação para os efeitos do art. 182.º n.º 3 da O.T.M.), ao passo que a requerida e os filhos ficaram a viver na casa de morada de família objecto de doação aos filhos menores pelos seus progenitores por conta da quota disponível, com dispensa de colação e com reserva de usufruto a favor dela doadora por escritura de doação, ficando a pertencer à ex-esposa do requerente, ora apelada (cfr. acordo sobre a atribuição da casa de morada de família, constante dos autos).
Porém, essa maior despesa resultante da aquisição de casa própria, no caso em análise, não pode ser tida em consideração já que ao assumir tal encargo bancário, o requerente bem sabia dos encargos que já tinha sobre os ombros, nomeadamente, o relacionado com a pensão de alimentos dos filhos menores.
Acresce que, antes de adquirir casa própria, o requerente residia em casa cedida graciosamente pelos pais e não está demonstrado que estes tenham deixado de poder continuar a ceder-lhe a casa.
Por seu turno, a requerida/apelada vive apenas com os menores, em casa própria – casa de morada de família – que pertenceu ao ex-casal, não suportando qualquer prestação ou renda com a mesma – cfr. ponto 9 da matéria de facto provada.
Finalmente, o requerente alegou e provou diminuição dos seus rendimentos oriundos do trabalho, a partir de 2006.
Tal situação resulta do exame aos documentos de liquidação de IRS dos anos de 2006 a 2009, constantes dos autos.
Da leitura desses documentos da Direcção Geral de Impostos constata-se que, embora o rendimento global/ilíquido tenha aumentado, já o rendimento colectável do recorrente tem vindo a baixar de ano para ano.
Assim:
- Em 2006, apurou-se rendimento global de € 47.642,56 e de rendimento colectável € 29.556,47;
- Em 2007, rendimento global de € 41.983,24 e rendimento colectável de € 28.314,84;
- Em 2008, rendimento global de € 46.157,33 e rendimento colectável de € 24.959,53;
- Em 2009, rendimento global de € 55.165,19 e rendimento colectável de € 22.295,02.
Analisando a liquidação de IRS/2008 (doc. de fls. 151) e como salienta o apelante, nas alegações de recurso:
“(…)
O rendimento global do recorrente no ano de 2008 no montante de € 46.157,33, fica imediatamente reduzido ao rendimento colectável de € 24.959,53, após retirar as “deduções especificas” que são os pagamentos para a segurança social e os “abatimentos” que são as pensões de alimentos pagas pelo recorrente à recorrida e aos seus filhos, todos os meses retirados “à cabeça”.
Se a esse valor se descontar o valor das retenções na fonte relativas ao IRS cujo valor anual retido pelo recorrente perfaz o montante de € 10.828,00, fica-se com o valor mensal anual médio que o recorrente tem ao seu dispor para viver todos os meses – resultando o mesmo da diferença entre o rendimento colectável menos a retenção na fonte (dinheiro que este não dispõe por ser retido na fonte pelo I---.), o que perfaz a quantia anual de e 14.131,53 que dividida por 12 meses – um montante mensal médio de € 1.177,62.
Esta é a realidade “financeira” do recorrente que acaba ter apenas algum desafogo quando lhe é reembolsado o IRS.
A situação piora no IRS de 2009, porque o art. 56.º do CIRPS foi alterado (melhor dizendo revogado) pela Lei n.º 64-A/2008 de 31.12.
Assim, nos termos do art. 56.º do CIRPS, antes da alteração (revogação), o valor pago pelo recorrente pelas pensões de alimentos eram considerados abatimentos ao rendimento líquido total e eram abatidas pela totalidade das mesmas.
Com a alteração legislativa introduzida pela lei mencionada, o valor pago por alimentos deixa de ser abatido ao rendimento total e passa a ser abatido à colecta apenas na proporção de 20 % dos mesmos, como estatui o art. 83.º-A do CIRPS na redacção mencionada.
Pelo que o recorrente, no IRS de 2009, vai apenas abater à colecta 20 % do valor total pago de alimentos, à recorrida e seus filhos, o que significa que o seu rendimento colectável será substancialmente aumentado (virtualmente apenas) e como tal irá pagar mais IRS a final, mas terá menos dinheiro efectivamente disponível.
Poderá mesmo vir a ser taxado em sede de IRS, com uma taxa mais elevada, por passar a ter uma matéria colectável mais elevada (por na mesma não se considerar a verba abatimentos).
(…)”.
Face a tudo quanto se deixou dito, afigura-se-nos ajustado o pedido de redução do montante da pensão de alimentos aos filhos menores, anteriormente fixado, face – como vimos – por um lado, à diminuição de despesas com a escolaridade do filho menor C derivada da circunstância do menor ter deixado a escola privada cuja mensalidade era de € 300,00 e passado a frequentar a escola pública e, por outro, ao facto de os rendimentos do requerente terem diminuído, posteriormente ao estabelecido no âmbito do acordo de regulação do poder paternal alcançado em 01.02.2005.
Como sustenta o apelante nas alegações de recurso “… Dispondo de uma média mensal anual (€ 1.177,00, já incluindo subsídios de férias e de Natal) da qual paga a sua prestação hipotecária – sem relevo na situação em causa – dispondo apenas do remanescente para pagamento das suas despesas com casa, alimentação, consumos, saúde, seguros, etc., …, o recorrente consegue gerir esta sua situação económica, com uma enorme frugalidade de vida e com o valor da devolução do IRS …”.
Sem esquecer que sobre o recorrente recai também o dever de alimentar os filhos sempre que estes estão com o pai todas as terças-feiras, após o horário escolar, até ao dia seguinte de manhã, fins de semana de sexta-feira por volta da 19 horas até domingo às 20 horas, de 15 em 15 dias, nos dias de aniversário dos filhos e do pai, Natal, Ano Novo, Páscoa e bem ainda durante o período de férias entre 15 a 30 dias (cfr. cláusulas 2.ª, 3.ª, 5.ª e 6.ª do acordo de regulação de poder paternal).
Como se refere no acordão do S.T.J. de 12.11.2009, in C.J. Ac. do S.T.J. de 2009, tomo III, págs. 141/143:
«(…)
O dever de alimentos a cargo dos progenitores não pode reduzir-se a uma mera obrigação pecuniária.
(…)
Mesmo quando já tenha sido objecto de acertamento judicial, isto é, quando corporizado, para o pai que não tem a guarda, numa condenação a uma prestação pecuniária, do lado do progenitor inadimplente não está sómente em causa satisfazer uma dívida, mas cumprir um dever que surge constitucionalmente autonomizado, como dever fundamental e de cujo feixe de relações a prestação de alimentos é o elemento primordial. È o que directamente resulta do n.º 5 do art. 36.º da C.R.P. ao dispor que os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos.
(…)».
Chegados aqui, entroncamos no princípio da igualdade do dever de ambos os progenitores na manutenção dos filhos – cfr. citado art. 36.º n.º 3 da C.R.P.
Com este princípio não pretende a lei que cada progenitor contribua com metade do necessário à manutenção dos filhos, antes visa que sobre cada um deles impenda a responsabilidade de assegurar, na medida das suas possibilidades, o que for necessário ao sustento, habitação e vestuário (alimentos naturais), bem como à instrução e educação (alimentos civis).
Acontece que o montante dos alimentos não pode ser desproporcionado com os meios de quem se obriga, mesmo que desse modo se não consiga eliminar por completo a situação de carência das pessoas a que a prestação é creditada.
Como salienta o apelante, nas alegações de recurso:
“ (…)
Assim, mesmo que se venha a entender que os menores necessitam desta medida de alimentos, tal não deve obstar à justa decisão deste pleito, que terá que afirmar e reconhecer a incapacidade do recorrente para continuar a prestar os alimentos na medida em que os presta, sem por em perigo a sua condição com o mínimo exigível de dignidade.
A obrigação alimentar impende sobre várias pessoas e não em exclusivo sobre o recorrente.
Portanto, tal não implica um juízo definitivo e absoluto de desmerecimento das necessidades básicas dos menores.
(…)”.
Tudo visto e ponderando que o recorrente – dependente apenas da sua actividade profissional por conta de outrem, como engenheiro de materiais no … (ponto 14 dos factos provados) – dispôs, em 2008, mensalmente, em média, de € 1.770,00, em 2009, menos ainda e, em Janeiro e Fevereiro de 2010 de € 1.152,45 e 1.223,28, respectivamente, para fazer face a despesas básicas comuns a qualquer pessoa, tal como alimentação, vestuário, transportes, despesas domésticas tais como água, electricidade, telefone, bem como para suportar o encargo com a prestação bancária na quantia de € 600,00/mês – que, como vimos, não releva no caso sub judice – ter-se-á de concluir que a capacidade económica do recorrente tem vindo a diminuir a partir do ano posterior à celebração do acordo do regulação do poder paternal, mostrando-se assim preenchidos os requisitos de facto e direito exigidos pelos arts. 2012.º e 182.º n.º 1, respectivamente, do C.Civil e da O.T.M.
Neste particular, adianta o apelante nas alegações de recurso que:
“(…)
O disposto no art. 2012.º do C.Civil que rege a alteração da prestação alimentar torna patente que na fixação dos alimentos tem sempre implícita a clausula rebus sic standibus, ou seja, a permanência das condições objectivas e subjectivas que a determinaram.
In casu, as possibilidades do obrigado diminuíram e o menor C há 4 anos que frequenta o ensino publico.
A redução é possível e apenas se verifica se e na medida em que as próprias circunstâncias que houverem influenciado a primitiva fixação se modificarem ulteriormente.
(…)”.
Finalmente, a sentença recorrida invoca o acordão do T.R.P. de 25.03.93 segundo o qual “... Na determinação das necessidades do menor, deverá atender-se ao seu padrão de vida, à ambiência familiar, social, cultural e económica a que está habituado e que seja justificável pelas possibilidades de quem está obrigado prestar os alimentos…” e mais adiante a referida sentença considera que “… a prestação dos alimentos não se mede pelas estritas necessidades vitais do menor (alimentação, vestuário, calçado, alojamento) antes visa assegurar-lhe um nível de vida económico-social idêntico ao dos pais, mesmo que estes já se encontrem divorciados…”.
Acontece que, no caso sub judice, o recorrente é quem sustenta a ex-esposa e os filhos e como diz o apelante nas alegações de recurso, por um lado, “… é do conhecimento geral que o divórcio é igual ao empobrecimento dos membros da família, precisamente por não se manter o mesmo nível económico permitido pela economia de escala vigente durante o casamento…” e por outro “... Em contrapartida, a recorrida, pessoa saudável, licenciada em Biologia, que vive em casa totalmente paga, não paga IRS por estar isenta, não trabalha desde o divórcio, apesar de nada ter alegado no sentido da sua impossibilidade para angariar através do seu trabalho, os proventos para o seu sustento e colaborar no sustento dos filhos, …, até porque os menores pela idade que têm actualmente já não necessitam de um dispêndio de tempo que inviabilize a possibilidade de trabalhar…”.
Como escreveu o Prof. Diogo Leite de Campos, Lições de Direito de Família e das Sucessões, Almedina, págs. 310-311, “(…) O dever de alimentos deve durar só durante um curto período transitório. Durante o período necessário para adaptação do ex-cônjuge mais necessitado, a uma vida económicamente independente, em que é da sua responsabilidade a angariação dos meios necessários à sua subsistência, (…), só não será assim em casos excepcionais. Suponha-se que o marido sempre impediu a mulher de exercer uma actividade remunerada. E que esta, depois do divórcio, por condições de saúde, idade ou outras, se encontra sem meios de ganhar o seu sustento. Neste caso, competirá ao marido sustentá-la indefinidamente (…)”.
Na verdade – atento os princípios de natureza legal e de direito natural – é imperioso que ambos os progenitores façam algum esforço para cumprirem dignamente a sua relevante função de protecção e amparo para com os filhos.
Tudo visto e ponderado, procedem, pois, as conclusões da alegação de recurso pelo que impõe-se a redução peticionada do montante de alimentos dos menores, passando o mesmo a ser fixado em € 600,00/mês, quantia sujeita ao regime dos aumentos anuais, nos termos estabelecidos na cláusula 4.ª ponto 2 do Acordo de Regulação do Poder Paternal, de 01.02.2005 (fls. 12/13).


IV –
Decisão
Por todo o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar procedente a apelação, revogando-se por isso a sentença impugnada e, em sua substituição altera-se a pensão total alimentar dos menores, C e D , reduzindo-a para € 600,00 (seiscentos euros) /mês, mantendo-se o regime dos aumentos anuais nos mesmos termos acordados no ponto 2 da cláusula 4.ª do Acordo de Regulação do Poder Paternal de 01.02.2005; e, ordenando-se, em consequência, que se oficie à entidade patronal do recorrente do novo valor da pensão alimentar dos menores para esta, em conformidade, proceder ao desconto da mesma directamente no seu vencimento.

Custas a cargo da apelada.

Lisboa, 28 de Abril de 2011

Gilberto Martinho dos Santos Jorge
José Eduardo Miranda Santos Sapateiro
Maria Teresa Batalha Pires Soares

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